14 julho 2013

Quando a morte passou de raspão ( memória 14 )


Memória 14
O mistério da morte sempre presente.

 

Por volta de 1954, talvez em Julho, na Prainha ou Praia dos Pescadores, como também é conhecida, em Itanhaém, estava com sua mãe e seu irmão quando, por descuido, uma onda mais forte o arrebatou e o levou.

Faz muitos anos, mais  de cinqüenta e tem na memória, ainda pedaços do triste acontecimento. Lembra-se que bebia muita água e sua mãe, já bem gorda por estar grávida e prestes a dar luz de sua irmã caçula, com o seu irmão no colo, tentava alcançá-lo em vão.

Bebia muita água. Afundava e flutuava... Repetidas vezes, afogando-se. O mar o levava... E sua mãe com o irmãozinho no colo tentava buscá-lo, mas não o alcançava. Um senhor percebendo o incidente adentrou chegando ao seu encontro o puxou d’água e o salvou do afogamento que acontecia.

Passados os anos, próximo ao  feriado de 7 de Setembro, talvez dia 15, foi à mesma Itanhaém, para tratar de assuntos profissionais. Reuniu-se com Elias, saudoso filho da senhora que vendia cocada pelas ruas da Praia dos Sonhos, Prainha e imediações, falecido prematuramente recentemente;l Waldir e outros na casa do primeiro,  e por não estar se sentindo bem do estomago, abriu mão dos acepipes e se quer bebericou durante a reunião.

Por volta das 14 horas ou um pouco mais tarde, partiu de volta para São Francisco do Sul, onde residia. Pretendia parar na cidade de Registro para assistir o clássico entre São Paulo e Santos, um jogo de futebol importante na ocasião em razão da tabela, pontuação, rivalidade e após, seguir viagem.

Interessante assinalar que Lourenço conhece a região desde seus 3 anos de idade e a estrada da banana, SP 55, rodovia Pe. Manoel da Nòbrega, desde que a ligação entre Itanhaém e a BR.116 era de terra. Conhece como a palma de sua mão. Inclusive conhece bem os municípios pelos quais a rodovia atravessa, alguns de seus distritos e tem alguns conhecidos por lá.

Sem exagero, sabe direitinho o relevo e as minúcias da rodovia, sendo uma estrada na qual se sente em casa ao transitar por lá. Ademais, motorista que é desde os 14 anos de idade, tem muita experiência no volante, inclusive nas rodovias e currículo impecável na direção de auto de passeio.

Costuma exibir com orgulho suas duas carteiras de habilitação de corredor de automóvel, expedidas pela Federação.

Com tudo favorável, naquele sábado ensolarado, já se encontrava nas proximidades de Itariri, próximo ao Hotel Juréia, antes da ponte, numa reta que permite ultrapassagem, posto ser pista única a rodovia, assim procedeu passando por uma carreta de carga de automóveis que do ABC paulista seguia na mesma direção e após a referida ponte, cruzou pelo acostamento de sua mão de direção, de forma a facilitar a curva que a estrada faz à direita, em direção ao sul do país.

Ocorre que Lourenço não contava que o acostamento sem pavimentação e com pedriscos, tirasse o automóvel, que estava leve, de sua fixação firme ao solo, de modo que ao adentrar no acostamento, praticamente perdeu o controle.

Em velocidade sobre as pedrinhas soltas e secas, o automóvel vazio e leve ficou sem controle do motorista, obrigando a retornar cuidadosamente à pista da rodovia.

Com a sua experiência raciocinou que jogaria as rodas do lado esquerdo no asfalto fixando-as novamente e assumindo o controle  perdido e depois retornaria como o veículo inteiramente na faixa de rolamento. No entanto, ao fixar a roda esquerda da frente no solo asfáltico, foi como se tivesse promovida bruscamente  uma freada e o auto rodou. Girou 90º graus e de ré, atravessou a pista em direção a entrada do hotel do outro lado da rodovia.

Nesse instante percebeu que a carreta que ultrapassara estava bem próxima e que em sentido contrário, outra, vindo do sul, em direção a Itanhaem, se aproximava.

Atravessando a pista de ré, sem qualquer comando sobre o carro, sentiu quando chegou novamente ao acostamento da pista contrária, junto ao hotel e escutou algo inesquecível:

- BRECA, BRECA, BRECA !

Por três vezes um comando firme, seguido e forte determinou que brecasse. E assim o fez, conseguindo parar o veículo, há uns 30 ou 40 centímetros do muro do hotel.

Por ser um hotel  o acostamento não tem a largura tradicional, sendo uma verdadeira área de escape, com relva e matinho, de modo a permitir o estacionamento e manobras de qualquer veículo. Assim, a área sendo grande, fez com que o automóvel próximo ao muro e numa posição perpendicular ao asfalto da rodovia que atravessara, ainda ficasse uns 2 ou 3 metros do leito da estrada.

A essa altura os dois caminhões pararam, cada um na sua mão de direção e os motoristas, desceram e foram ao seu encontro que estava bastante assustado e paralisado dentro do automóvel.

- Você é louco. Poderia ter sofrido um acidente fatal, disse um dos motoristas.

Depois de alguns minutos, após verificar a lataria e experimentar o veículo vistoriando a existência de algum dano, reiniciou a viagem, bastante tenso.

Seguindo viagem, naquele meio de tarde de sábado, entrou na cidade de Pedro de Toledo, foi a uma oficina mecânica que se encontrava aberta e fez uma vistoria no automóvel. O carro foi suspenso e o mecânico olhou minuciosamente  o sistema de direção, rodas, freios... E como tudo estava em ordem e a hora do jogo se aproximava, foi até Miracatu, um tanto mais adiante, há 60 Km. antes de Registro onde houvera planejado parar, entrou num bar e assistiu o jogo entre  São Paulo e Santos.

Mais calmo, à noite chegou a sua casa e contou o que acontecera.

Interessante e merece relatar que  no momento que o veículo atravessou a pista, fora de seu controle, de ré, saindo da mão para o outro lado, viu nitidamente os momentos que aos 4 ou quase 5 anos de idade, quase morreu afogado. Viu rapidamente a cena que pelo tempo praticamente já havia esquecido.

O intriga bastante também a voz que mandou que brecasse, identificada como sendo de seu pai, falecido em Dezembro do ano anterior.

Sem comentários outros.

Agora tem certeza: Foi em 15 de Setembro de 2007, um sábado. Provavelmente o dia que tornou a nascer.

Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.br
Membro da Academia Eldoradense de Letras
Membro da Academia Itanhaense de Letras
Membro da  cadeira nº 35 da Academia São José de Letras.

 

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