Memórias nº 93.-
Aventuras no
Judiciário.
Melindres. Truculências. Vagabundagem. Prepotências.
A advocacia é bastante dinâmica. Exercer a advocacia por mais de
trinta anos traz inúmeras recordações. Boas a maioria delas e não tão boas outras.
Assim que chegou em São
Francisco do Sul, vindo de Gurupi onde fora presidente da OAB e se encontrava
licenciado, dada a mudança de domicilio, teve conhecimento que um dos
Magistrados da Comarca era truculento e injusto. Não julgava e manifestava-se
bastante tendencioso.
Os advogados reuniram-se para
representar contra o Magistrado. Queriam providencias do Tribunal de Justiça de
Santa Catarina e Lourenço, foi um dos líderes do movimento.
Uma das razões por cautela
dos demais. Outra porque era experiente e líder. E ajudou sobremaneira o
movimento. Não poderia agir de outro modo.
No passado, quando secretario
da OAB em Itanhaém, tivera problema semelhante e se juntou aos colegas e ajudou
a aprovar medida contra o Juiz de Direito, representando-o no Tribunal de
Justiça.
Vai e vem. Lero lero. O
Tribunal o muda da primeira para a segunda Vara Judiciária da Comarca e
instaura um processo disciplinar. O interventor convoca a sociedade para apresentar
reclamações, oferecer denúncias e discorrer sobre o comportamento do Juiz de
Direito relapso, autoritário e sem postura digna da honrada carreira.
Lourenço é um dos poucos
advogados que reúne pessoas da sociedade local para apresentar os reclamos ao
interventor. Lourenço também depõe e, ao final, o Dr. J. K.* é convidado a
pedir remoção.
Nada mais que isso.
Àquele tempo se o Conselho
Nacional de Justiça já existisse provavelmente o Magistrado teria sido punido
com rigor: Teria sido afastado do cargo, demitido e sofrido processo civil e
criminal. Hoje é Juiz de Direito Substituto de II Grau no Tribunal de Justiça
do Estado, em total desmoralização do Poder Judiciário.
(...)
Antes, ainda ao tempo que
residia em Gurupi, certa vez a Magistrada não apareceu para realizar uma
audiência e Lourenço representou contra a mesma, que ainda naquele mesmo dia, à
noite o procurou em sua residência para se esclarecer.
Em Itanhaém dado o rigor e
altivez com que tratou determinado Magistrado que não agia como deveria e a
postura do cargo exigia, ao ir se despedir do mesmo, quando decidiu mudar-se
para Gurupi, o mesmo recusou a estender-lhe à mão, numa agressividade
incomensurável. O fato se deu no recinto da Vara Judicial, sem a presença de
qualquer pessoa, inibindo de ultimar medidas criminais contra o Magistrado.
Lourenço que fora por três
gestões seguidas secretário da Ordem naquela subsecção paulista, detinha grande
liderança e foi um dos advogados que mais atuou na tentativa de remover o dr.
I. A.** da Comarca. Ficou marcado. Próprio de um sujeito desqualificado para
atuar no elevado posto de Juiz de Direito do Estado de São Paulo.
Noutra ocasião, um fato muito
interessante marcou bem o exercício de sua profissão. Foi à época que o Forum
da Justiça em São Francisco do Sul estava em reforma e se encontravam
instalados, em condições precárias no Clube Ipiranga, as varas e os cartórios
judiciais.
Lourenço orientou ao cliente
que o acompanhasse para ir tentar conseguir fosse deferida liminar em tutela
antecipada ao gabinete da Juíza de Direito. Recomendou que não atendesse a
eventual convite para sentar à mesa da Magistrada e se lhe fosse pedido às
chaves ou para se retirar que o acompanhasse, pois tudo fazia parte da
estratégia.
(...)
No gabinete, uma sala
improvisada, onde dois Magistrados ficavam juntos, defronte um ao outro, junto
com os respectivos escreventes e bastante gente, Lourenço adentrou com o
cliente e ponderou:
- Excelencia é preciso
conceder a liminar, pois a pauta de audiências está sendo marcada para seis
meses e ele não tem mais condições de permanecer nessa situação... ( blá...
bla´... blá... )
E a Magistrada reticente
pouco dizia, apenas afirmava que não daria.
- Excelencia o que irá
acontecer é que o cliente então abandonará seu posto. A cidade irá ficar sem
água. Ele não vai mais prestar serviços. Ele vai embora e a cidade não terá
água bombeada do continente. Para manusear as bombas e toda aquela aparelhagem
precisa ter conhecimento e a empresa não dispõe de outro servidor
qualificado...
(...)
- Diante do exposto, das
ponderações apresentadas por V. Excelência, então não resta outra alternativa...
e virando-se para o cliente que permanecia ao lado, em pé, disse com firmeza:
Me dê as chaves.
Prontamente atendido, pegou o
molho de chaves da casa das máquinas que bombeiam água para ilha de São Francisco,
puxando de represa situada no continente e atravessando mais de 4 km. sob a
baia de Babitonga, e com segurança e firmeza colocou sobre a mesa da Juíza de
Direito, sob o olhar dela, da secretária e de outros que estavam por lá e se
espantaram com o barulho.
- Até logo, vamos embora.
No saguão, parou e permaneceu
relaxando, junto com o cliente que tudo presenciara e, ambos em pé tentavam
aliviar a tensão do incidente. Foram mais de dez minutos de diálogo tenso, no
qual ficara resolvido que as chaves da casa das máquinas estariam daquele
momento para frente sob a responsabilidade direta da Pretora, e a cidade
ficaria sem água. A ilha ficaria seca.
- Doutor, me haviam dito que
o senhor é porreta. Mas realmente o senhor é mesmo porreta. O senhor é Fudido!
Exclamou espantado o cliente, que percebera a firmeza do advogado em discutir
com a Magistrada.
Assim que o cliente terminou
de falar e descrever ao seu modo o que presenciara, a secretaria da Magistrada,
com as chaves numa das mãos, o processo noutra, os abordou e disse que a Juíza
de Direito resolveu atender os reclamos e designara audiência de justificação
para realizar-se em sete dias, tempo de citar a parte contrária.
- Assinem aqui, por favor,
para saírem intimados.
(...)
Noutra ocasião Lourenço foi
protocolar um documento na Justiça Federal em Joinville. Iria pessoalmente para
falar com o Magistrado. Era urgente e somente para esse fim, deslocou-se de
onde residia, em São Francisco do Sul e foi à Cidade dos Príncipes, distantes
56 km.
O protocolo não se completou
e o Juiz Federal não pode atende-lo. Simplesmente disse que não o atenderia,
mandando um recado, por intermédio do secretário da secretária de sua Vara
Judiciária.
- Me de o livre de
reclamações, disse Lourenço ao servidor, que o atendeu. Deixou registrada sua
reclamação. Inclusive assinalou que iria
relatar o fato à OAB e a Corregedoria do Tribunal Regional.
A noite, em sua casa, o
Magistrado ligou e se explicou. Era Juiz Federal Substituto e arrolou inúmeras
razões. ( Reforma do prédio, mudança de andar, correição ... )
Diante das ponderações o
prazo foi devolvido e o ato completo a seguir.
Situação idêntica anos antes
se dera em Gurupi. Noutras comarcas igualmente não foram poucas as vezes que as
audiências tiveram o seu inicio atrasado mais de meia hora e Lourenço registrou
o fato e se foi, promovendo reclamações à Corregedoria em alguns casos.
Muitos foram os incidentes
dessa natureza, quer nas Varas Federais, do Trabalho ou da Justiça dos Estados de
São Paulo, Tocantins e Santa Catarina principalmente.
Também não foram poucas as
representações e reclamações verbais e escritas contra meirinhos e servidores
do Poder Judiciário por desídias desses funcionários. Algumas foram concluídas
com a penalização desses, outras na maioria delas, não.
Recentemente após concluir uma audiência no foro de Cananeia, que estava sem Juiz titular, conversou com a Magistrada e se expressou falando que a ausência de Juiz de Direito trazia uma lacuna muito grande para a Comarca. A Magistrada, nova, substituta da circunscrição, se milindrou:
- Doutor eu sou a Juíza.
Lourenço tentou esclarecer que se referia a ausência de titular. Das inconveniências da vacância, mas ela não se deu por convencida e nunca mais se fez isenta com Lourenço. No que pode ser menos tolerante o foi...
Mas Lourenço adquiriu alguns
amigos no Judiciário. Entre outros, o Dr. Carlos Alberto Barbosa, que o ajudou
sobremaneira para de fumar, destacado
Juiz de Direito do Estado do Tocantins. Também formou alguns magistrados que
militam em diversos foros do país.
Enfim, nessas lembranças,
Lourenço conta que ao longo da sua jornada de advogado se deparou com ótimos
magistrados e promotores ou procuradores de todos os segmentos da Justiça, mas
também teve que enfrentar alguns juízes não bem intencionados.
- Hoje existe o Conselho
Nacional de Justiça, mas antes...
Roberto J. Pugliese
Consultor
da Comissão Nacional de Direito Notarial e Registrária da OAB.
(*
e ** = Os Magistrados se encontram ainda na ativa – Abreviações fictícias )
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