12 outubro 2023

Tribunal de Justiça Desportiva Universitária : Cinquenta anos depois.

 
 Reencontro casual ! JUB's 2023.
 
A surpresa realmente fora grande. 
 
1/
Joinville recebendo por duas semanas os cinco mil atletas de todos os cantos do país para participarem dos Jogos Universitários, fazendo da Cidade das Flores, nesta primavera chuvosa, verdadeiro canteiro colorido de jovens inquietos, agitados e barulhentos.
 
A apresentação se dera na véspera. Solenidades, discursos, volta olímpica das delegações embandeiradas. Formalidades típicas e tradicionais com meninas e meninos ávidos para curtirem a chuvosa cidade gelada, úmida, fria, loira, alemã, bem comportada, imediatamente após se livrarem do tedioso  protocolo.
 
- Bagunçar ...
 
Na terça feira fui visitar uma das  praças de esportes nas quais as competições se realizam. Aleatoriamente optei pelas situadas na Expoville, centro de eventos estrategicamente situado na entrada principal da cidade. 
 
 
 
 ( Handebol em andamento ///Expoville )
 
De plano, já no estacionamento deu para perceber a pulsação orgânica de jovens de todas as idades espalhados e em grupinhos discutindo, cantando, se abraçando, se beijando... com sotaques diversos, mostrando a grandeza de um povo miscigenado, amarelo, negro, vermelho, moreno, claro... que se mostra vivo e sadio. Pitoresco e interessante.
 
Senti um Brasil unido, sem qualquer ranço ideológico que nos últimos anos estamos vivendo, revelando nojo e ódio  que nunca fizeram parte do comportamento social brasileiro. Percebi  a mocidade bem diversificada, revelando estarem juntos, ainda que adversários e competidores, mas com o sentimento de brasilidade.
 
Pelos agasalhos já identificava, ora pela bandeirinha afixada, como a " Nego " da Paraíba ou com as listas tricolores do Maranhão; ora pelas cores, como a do uniforme preto, com faixas brancas e vermelhas bem paulistas ou verde com araucária estampada do Paraná... Olhava e me testava... Até as tradicionais arcadas modernistas do Alvorada eram marcas da Capital da Esperança  usadas pelos atletas do Distrito Federal.
 
- Veio de onde?
- Somos do Amapá... 
-  Vim do Pará...
- Sou goiano..  
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Tinha gente de todos os cantos... e com sotaques fortes. Um árbitro profissional do Rio Grande do Norte  esclareceu que havia saído na véspera com 40º graus e estava com muito frio naquele final de tarde  cinza, nublado e umedecido.
 
- Esse é o Brasil que nem todos sabem valorizar e apreciar...
 
2/
Assisti algumas partidas de handebol que aconteciam em quadras situadas num ginásio coberto enorme... Se não errei, eram no mínimo seis quadras oficiais, com cinco lances de pequenas arquibancadas dispostas nos lados, além do espaço deixado para aparelhagem eletrônica para medição de tempo, placard e filmagens dispostas em todas elas. Muito bem estruturadas e equipadas.
 
Numa delas o Mato Grosso goleou  Rondonia por 46 a 9. Noutra o Mato Grosso do Sul estava ganhando do Rio de Janeiro, por 3 gols de diferença quando me retirei... O Tocantins venceu a Paraíba...  
 
Observei ainda alguns paramédicos ao redor das quadras, guardas municipal e funcionários da prefeitura zanzando com interfones... total assistência para tudo funcionar aos costumes das regras rígidas tradicionais da cultura bavária.  Em quantidade, talvez exagerada, plaquinhas indicativas de saída, refeitório, banheiros, tribunal e inúmeras outras informações. Outras  proibitivas, como de um cãozinho com uma faixa vermelha em diagonal...ou proibido fumar...

No páteo onde deixara meu carro percebera diversos ônibus das delegações e veículos da polícia e bombeiros... Um pouco de exagero da organização. Também um galpão disposto para confraternizações, no qual soube que trata-se de espaço da Rádio Joinville Cultural, concessão da Universidade Federal, administrada pela Prefeitura, no qual ao longo dos jogos haverá programação especial em comemoração ao aniversário de onze anos... Não entendi bem.
 
Procurei a delegação do Tocantins pois queria trocar conversas com os jovens de lá por razões óbvias. ( Para quem não lembra fui professor universitário e tive uma vida social e política muito intensa durante o tempo que estive naquele Estado. ) Também, a delegação paulista. Não só pela minha origem mas também porque integrara o Tribunal Universitário ao tempo que estudei na PUC.  Subi, desci, rodei bastante, mas não os encontrei.
 
- Jogaram e foram embora...
 
3/
Andando pelas dependências do pavilhão onde aconteciam jogos percebi uma escadaria e para estar bem informado dos acontecimentos,  indaguei para um senhor, com trajes esportivos, parado próximo ao primeiro dos trocentos degraus, que displicentemente observava  a multidão quieto.  

- O que tem lá em cima?

Muito solícito, talvez percebendo que no meio daquela multidão travessa fosse o único indivíduo cuja aparência revelava ter idade próxima a dele, provavelmente uns dez anos mais, bem diferente daqueles meninos e meninas contemporâneos a filhos, sobrinhos, netos e amigos destes, não só mencionou como sugeriu me acompanhar e mostrar tudo, o que agradeci, aceitando e engatando um papo de velhos amigos, já fixei uma das pernas no primeiro degrau, expressando interesse saliente, evitando que mudasse de ideia.
 
-Sou de São Paulo, advogado e auditor do Tribunal. ... E foi subindo ao meu lado,  contando um mundo de fatos referente ao JUB's e o universo desportivo universitário.
 
                
 
 Já no piso superior, apontou para um enorme bandejão.  O ingresso só é permitido para os que detém crachá da organização. Talvez por serem  preços subsidiados, como é costume nestes eventos. Depois mostrou uma sala onde solitário estava um jovem sentado a uma única mesa, que nos recebeu com delicadeza e educação.
 
- É a sala da presidência do evento, me informou o cicerone que sabia de tudo. O rapaz um assistente ou algo nesse patamar... que justificou que não iria nos acompanhar, porque eram 18 horas, momento que diariamente costuma fazer suas orações. 
 
- ( ? ) Interessante nos dias de hoje...comentei ao sairmos e prosseguir nas visitas.
 
A esta altura, já havia revelado que fiz parte da FUPE, pertencendo ao Tribunal de Justiça Universitária, entre os anos de  1971 a 1977 ... sendo o escrivão da Corte. Disse que à época a Federação era sediada em uma pequena sala no Parque de Exposições Fernando Costa, na  Água Branca,  onde outras dezenas de entidades amadoras também tinham suas sedes.

Contei que nos JUB,s de 1973, talvez ou 74, fui ao Espírito Santo, cujo evento se dera no campus da Universidade Federal onde me hospedei. E que 1976, recém casado, fui com a minha mulher à Belo Horizonte participar doo JUB's... 

Papo vai, papo vem, Longo, o gentil cicerone, se tornara  velho amigo da cartolagem de esporte universitário, mostrava as salas, indicava personagens e se mostrando honrado com a minha companhia adentrou à sala da Comissão Disciplinar e do Tribunal de Justiça Desportiva Universitária, iniciando uma série de apresentações.

Eram poucos os presentes em razão do horário.  Muito grande, no entanto, o ambiente  demonstrava estar pronto para acomodar muitos auditores, advogados e outros agentes indispensáveis para composição  e funcionamento regular da Justiça Universitária Desportiva. Pelas cadeiras e computadores ficou patente  o espaço tratar-se de solene e respeitado recinto de atos formais, burocráticos e estilosos, próprios das Cortes, sejam elas judiciais ou administrativas.

Gente muito afável, fui surpreendido pelo presidente do Tribunal que ao ouvir meu nome, disse tratar-se de um nome forte, que conhecia meu filho e sabia que era um expoente do Direito Desportivo Nacional. O secretário, ou escrivão, como eu fora um dia, vindo de Ponta Grossa, onde reside, torcedor do Operário como revelou, disse conhecer um amigo que é professor de jornalismo na Universidade Estadual.

- ...  foi candidato à prefeitura local.

Enfim, ao me despedir, agradecendo o modo pelo qual surpreendentemente foram gentis, convidaram-me à assistir a um julgamento, o que emendei comprometendo-me retornar.


    
 ( troféus recebidos em 1974 e 1976 // FUPE )

Ainda perambulei por lá. Conversei com muitos jovens. Uma vibração que me fez bem. Sintonia de leveza à semelhança da juventude que povoa o país.
 
Percebi todos contentes, despreocupados, interessados em conhecer a cidade, zoar, paquerar e tomar o verdadeiro chopp bem tirado nas tantas e tantas  cervejarias espalhadas pela cidade.
 
- Amanhã iremos à Festa das Tradições, me disse a jogadora de xadres do Maranhão.
 
Senti que longe dali, perdido num tempo já distante,  na  Associação Atlética 22 de Agosto, a entidade desportiva da PUC o espírito dos que a  frequentavam  era idêntico. Recordei da rua Monte Alegre, do Diretório e do Centro Acadêmico, instalados numa casa do outro lado da rua; da repressão política,  de muitas e muitas lembranças ainda vivas. 

Enfim, a confusão de  atletas, de suas batucadas e gritos de guerras interessantes, com fala arrastadas em sotaques, demonstrando serem incansáveis, articulando-se em planos e ideias, mesmo sem grande importância,  revelou que hoje, como ontem, a juventude impulsiona e resiste. 
 
A juventude na desordem de seus próprios conflitos, se organiza livre e solta e resiste, como resistimos, nós daqueles tempos, enfrentando bobagem e coisas sérias. Ao modo peculiar de suas épocas, vivem o dia a dia rabiscando a história do tempo como outros pergaminhos foram desenhados e se encontram arquivados nos cofres seguros das memórias indevassáveis.

- Vou assistir mais jogos, conversar  com a galera ...

Roberto J. Pugliese
editor
www.puglieseadvogados.com.br
Foi  Secretário do Tribunal de Justiça Desportiva /FUPE.


 




 
 
 
 
 
 


 
 

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