11 outubro 2025

 Discurso Emocionado de Luís Roberto Barroso.

 

 O Expresso Vida publica a Carta de Despedida do Ministro Barroso do Excelso Supremo Tribunal Federal.

Vale a leitura e apreensão do pensamento profundo deixado por sua Excelência. 

  

CARTA DE DESPEDIDA

Brasília, 9 de outubro de 2025.

Excelentíssimo Senhor
Ministro LUIZ EDSON FACHIN
Presidente do Supremo Tribunal Federal
Excelentíssimo Senhor Presidente, querido amigo, prezados colegas:


Por 12 (doze anos) e pouco mais de três meses, ocupei o cargo de
ministro deste Supremo Tribunal Federal, tendo sido presidente nos últimos dois anos.
Foram tempos de imensa dedicação à causa da Justiça, da Constituição e da Democracia.
A vida me proporcionou a bênção de poder servir ao país, retribuindo o muito que recebi,
sem ter qualquer interesse que não fosse fazer o que é certo, justo e legítimo para termos
um país maior e melhor.


Ao longo desse período, enfrentei e superei, com discrição,
dificuldades e perdas pessoais. Nada disso me afastou da missão que havia assumido
perante o país e minha consciência de dar o melhor de mim na prestação da justiça. Na
presidência do Tribunal e do Conselho Nacional de Justiça, percorri o país, literalmente,
do Oiapoque ao Chuí, em contato com os magistrados e os cidadãos, procurando aproximar
o Judiciário do povo. Conversei com todos: indígenas e produtores rurais; patrões e
empregados; situação e oposição. Não discriminei ninguém. Conheci mais profundamente
o país, na sua pluralidade e diversidade, e vi aumentar o meu amor por essa terra e sua
gente.
 

Sinto que agora é hora de seguir outros rumos. Nem sequer os tenho
bem definidos. Mas não tenho qualquer apego ao poder e gostaria de viver um pouco da


vida que me resta sem a exposição pública, as obrigações e as exigências do cargo. Com
mais espiritualidade, literatura e poesia. Como todos nós sabemos, os sacrifícios e os ônus
da nossa função acabam se transferindo aos nossos familiares e às pessoas queridas, que
sequer têm qualquer responsabilidade pela nossa atuação.


Gostaria de me despedir com uma breve reflexão sobre a vida, sobre
o Brasil e sobre o Supremo Tribunal Federal.


Apesar da agressividade e da intolerância que ainda se vê aqui e acolá,
reafirmo a minha fé nas pessoas, no bem, na boa-fé, na boa-vontade, no respeito ao
próximo e na gentileza, sempre que possível. Fora desta bancada, continuarei a trabalhar
por um tempo de paz e fraternidade. Reitero: a integridade, a civilidade e a empatia vêm
antes da ideologia e das escolhas políticas. O radicalismo é inimigo da verdade. A gente
na vida deve ter cuidado para não se apaixonar pelas próprias razões.


Apesar das dificuldades que ainda não superamos, como a pobreza e
a desigualdade, reafirmo a minha fé no Brasil, o país mais lindo do mundo, da Amazônia
ao Pampa, do Cerrado à Mata Atlântica, das praias e montanhas às quedas d’água.
Parodiando Pablo Neruda, mil vezes tivera que nascer e eu queria nascer aqui. Mil vezes
tivera que morrer e eu queria morrer aqui. Aqui vivem meus filhos amados e gente querida
que a vida voltou a me trazer.


Todos nós julgamos causas difíceis, complexas, com interesses
múltiplos. E cada um procura fazer o melhor. De minha parte, ao longo desses anos, diante
das questões mais delicadas, eu as estudei, refleti e me convenci de qual era a coisa certa a
fazer. E fiz. Não carrego nenhum arrependimento nem nunca tive medo de nada. Não falo
isso por pretensão ou arrogância, mas por minha crença mais profunda: a de que o Universo
protege as pessoas que se movem por bons propósitos.

Reafirmo, por fim, minha crença na educação, inclusive e sobretudo,
na educação pública para quem precisa. Eu nasci em Vassouras, uma adorável cidade do
interior, numa família simples e sem parentes importantes. Estudei o primário e o ginásio
em escolas públicas e me formei em direito em uma maravilhosa universidade pública, que
é a Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Devo quase tudo aos meus professores e à
educação que recebi. E hoje sou convidado pelas principais universidades do mundo. Falo
isso, também aqui, não por pretensão ou arrogância, mas por gratidão. O Brasil me deu
tudo o que eu tenho, muito além do que sonhei quando tudo começou.


Ao longo dos anos, aprendi a conviver e a admirar os colegas com os
quais compartilhei a aventura de fazer justiça nesse país formidável, mas complexo. Cada
um com sua individualidade e características pessoais contribui para a defesa da
Constituição, com o pluralismo próprio das sociedades abertas.
Ministro Gilmar Mendes, a vida nos afastou e nos aproximou. Fico feliz que tenha
sido assim e sou grato por sua parceria valiosa ao longo da minha gestão e por sua defesa
firme do Tribunal nos momentos difíceis.
Ministra Cármen Lúcia, sua integridade pessoal e compromissos com o Brasil
irradiam uma luz que ilumina este Tribunal e inspira pessoas pelo país afora. Levo V. Exa.
no coração para sempre.


Ministro Dias Toffoli, sua capacidade de gestão e sensibilidade fizeram enorme
diferença para o Tribunal, em decisões como a ampliação do plenário virtual e o inquérito
que permitiu desbaratar o extremismo antidemocrático no país.
Ministro Luiz Fux, somos amigos desde quando eu estava nos bancos escolares.
Você foi o celebrante do meu casamento feliz e estar ao seu lado aqui no Tribunal todos
esses anos foi motivo de alegria e orgulho para mim.
Ministro Alexandre de Moraes, eu e todos nós somos testemunhas da sua dedicação
ao trabalho, ao país e à causa da proteção das instituições e somos solidários com os preços

pessoais elevados que está tendo de pagar e que um dia a história haverá de reconhecer e
reparar.
Ministro Kassio Nunes Marques, virá missão importante no seu caminho, que será
a presidência do TSE. Desejo-lhe toda sorte. E continuaremos a compartilhar as aflições
rubro-negras e o gosto pela arte e pela música brasileira.


Ministro André Mendonça, renovo aqui meu carinho e admiração por sua
integridade, fidelidade aos próprios valores e a seriedade com que lida com os grandes
problemas nacionais. Sinto alegria quando concordamos e respeito quando divergimos. A
amizade não tem coloração política.


Ministro Cristiano Zanin, sua fidalguia, discrição e imensa competência desfizeram
todos os prognósticos maliciosos e revelaram um juiz vocacionado, justo e brilhante. Sou
muito feliz por havermos nos tornado amigos.


Ministro Flávio Dino, sua cultura, brilhantismo e senso de humor fazem a vida de
todos nós mais leve e agradável. Tem sido um privilégio compartilhar da sua amizade ao
longo de todas essas décadas. Vou continuar a ouvi-lo com interesse, ainda que lá de fora.
Ministro Edson Fachin, parto seguro de que o Tribunal está sendo conduzido pelo
que há de melhor no país em termos de honestidade de propósitos, de idealismo e de
competência.


Estendo meu carinho e estima ao Procurador-Geral Paulo Gonet
Branco, aos meus assessores, na pessoa da Aline Osorio, e a todos os servidores da Casa,
na pessoa da nossa Assessora de Plenário, Carmen Lilian Oliveira de Souza. Registro,
ainda, meu especial apreço pela Imprensa, aqui representada por competentes setoristas.
Nesses tempos de desinformação e de perda da importância da verdade, nunca precisamos
tanto da Imprensa profissional, que se move pela ética e pela técnica jornalística, que checa
as notícias e distingue fato de opinião. Mentir precisa voltar a ser errado de novo.
Por fim, sou grato à presidente Dilma Rousseff, que me nomeou para
o cargo da forma mais republicana possível, sem pedir, sem insinuar, sem cobrar. E ao
residente Lula por sua firme defesa do Tribunal quando esteve sob ataque. Com altivez,
mas sem bravatas, cumprimos com honra nosso dever e nosso destino. A história nos dará
o crédito devido e merecido.


Deixo o Tribunal com o coração apertado, mas com a consciência
tranquila de quem cumpriu a missão de sua vida. Não foram tempos banais, mas não
carrego comigo nenhuma tristeza, nenhuma mágoa ou ressentimento. Começaria tudo
outra vez, se preciso fosse. Sigo achando que a afetividade é uma das energias mais
poderosas do universo. Por isso, fico feliz por deixar aqui amigos queridos e boas
lembranças, bem como renovo minha confiança de que o Supremo Tribunal Federal
continuará a ser o guardião da Constituição e um dos protagonistas na preservação da
estabilidade institucional do país e da democracia.


Esta é a última sessão plenária de que participo. Decisão longamente
amadurecida, que nada tem a ver com qualquer fato da conjuntura atual. Há cerca de dois
anos, comuniquei ao Presidente da República essa possível intenção. Fico no tribunal mais
alguns dias da próxima semana para devolver dois ou três pedidos de vista e encerrar as
pendências. Ao apresentar meu pedido de aposentadoria, após mais de 40 (quarenta) anos
de serviço público, transmito a Vossa Excelência e a todos os colegas a expressão do meu
afeto profundo e sincero, com os melhores votos de sucesso continuado e boas realizações.
Assim seja, amém.

 Luís Roberto Barroso

 

PARABÉNS AO MINISTRO QUE PLANTOU E DEIXA EXEMPLOS A SER SEGUIDO POR BRASILEIROS QUE AMAM ESTE PAÍS.!

 

Roberto J. Pugliese
editor
  


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