Memória nº 116
Collor –
Lourenço chegara de mudança no
início de janeiro de 1990. Viera com a família se estabelecer no Estado criado
pela Constituição Federal, no qual o fluxo migratório era bem grande, com
pessoas vindas de todos os cantos do país que chegavam trazendo entre outras
bagagens muita esperança.
Comprara duas casas na
cidade. Uma delas reformara para acomodar a família. Casa grande, com ótimo
quintal, quatro dormitórios, térrea, próxima ao centro da cidade, que anote-se,
não tem um centro verdadeiro, mas apenas uma região mais central.
A outra mais distante, porém
uns cinco ou seis quarteirões à oeste, em direção à rodovia federal.
Estava se acomodando na
cidade, no Estado, na vida nova bem diferente de Itanhaém, de onde viera; de
São Paulo onde nascera, enfim, do sudeste onde sempre vivera, quando dois ou três
dias antes de dar posse ao sucessor, o então presidente da República José
Sarney decretou feriado bancário.
Collor de Melo assumiu e
tomou medidas radicais, entre outras bloqueando
os depósitos bancários e aplicações em investimentos financeiros e outros
ativos, de forma a deixar a população brasileira perplexa e sem dinheiro.
Para Lourenço, fora de seu
habitat, sem movimento e clientela no escritório que recém instalara, foi dramático.
Não tinha a quem se socorrer e isolado, no meio do país, a solução era
enfrentar com coragem e dignidade a surpresa que fora o golpe do
presidente irresponsável.
Sem recursos hábeis, pois de
surpresa teve bloqueado os guardados para enfrentar o início de nova vida no
Estado do Tocantins, dedicou-se mais às aulas da Fafich onde fora lecionar e se
empenhou no desenvolvimento de sua banca de advocacia.
Sem dinheiro se quer viajar e
visitar familiares em São Paulo poderia faze-lo, pois distante 1.300 km o custo
dessa movimentação não era pouco...
Saudades.
Muitas saudades dos pais, dos
amigos, do mar, da Mata Atlântica...quando numa manhã recebe no seu escritório
telefonema de Tambaú, na qual o escrivão de polícia da delegacia local o
intimava a comparecer para esclarecimentos...
Tambaú, no interior paulista,
distante de Gurupi, aproximadamente 1.000 km para prestar depoimentos num
inquérito que estava envolvido fulano de tal, conhecido por Luiz Barbudo,
radialista que mudara de Itanhaém para lá.
Problema sério.
Sem dinheiro e sem saber o
que fazer, decidiu não dar atenção e aguardar eventualmente intimação por
precatória, inclusive para saber o que se tratava. Recorda-se que a fama do
Luiz Barbudo em Itanhaém não era boa no que diz respeito a cumprir obrigações
financeiras e que advogara para ele em algum caso sem muita relevância.
Tempos depois quando a
situação econômica própria melhorou, resolveu ligar para a mesma delegacia de
polícia pois não fora intimado oficialmente e questionou o que se passara e se
teria mesmo que ir prestar os esclarecimentos, sendo informado que tudo já se
resolvera e que estava arquivado o inquérito.
Momentos difíceis e
preocupantes de um tempo que passou e permanece na memória. Momentos
preocupantes que ajudaram criar o branco de sua barba e rarear seus cabelos.
Collor traíra o país.
O tempo passou e Lourenço
coordenou, já na condição de presidente da OAB em seu primeiro mandato, a
primeira passeata no Estado do Tocantins para provocar o impedimento daquele
presidente sem vergonha.
Roberto J. Pugliese
(
Foi presidente por dois mandatos da OAB-TO-Gurupi )
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