Avenida Itororó !
Por volta de 1958, época que a cidade era a terra da garoa, elegante, formosa e europeia, após o almoço, sua mãe o levava à pé até a esquina da Avenida Brigadeiro Luiz Antonio. Diariamente das imediações das obras do futuro Hospital Infantil Menino Jesus, no Bixiga, passavam pelo teatro e na esquina do movimentado cruzamento ela o atravessava para que seguisse sozinho.
Subia a Rua Treze Maio, então estreita, com paralelepípedos, raros prédios e nenhum comércio. Próximo ao Hospital Alemão descia à Rua João Julião, cruzava a Companhia Telefônica Brasileira em direção a Rua Maestro Cardin até o recém parcialmente inaugurado hospital da Sociedade Beneficência Portuguesa.
Daí adentrava pela trilha, sem calçamento e iluminação, raros transeuntes, sombreada por árvores centenárias, penetrando no interior do que restava de Mata Atlântica viva, original, urbana e pela escada, estreita, íngreme, rústica e precária, com degraus mal dispostos, descia até a pontezinha de madeira, igualmente rústica e artesanal que atravessava o córrego Itororó, filete estreito de águas límpidas, que das nascentes não muito longe descia sinuoso e calmo em direção ao Anhangabaú.
Sua avó confidenciará que naquele vale de bosque natural seria construída a Avenida Itororó, que a partir do vale do Anhangabaú alcançaria Congonhas, facilitando o tráfego para o aeroporto, Santo Amaro, Itapecerica da Serra... Projeto audacioso do prefeito Washington Luis.
Uma floresta densa encravada no bairro da Liberdade, revelando pitoresco cenário próximo à Catedral Ortodoxa, à fábrica de cerveja e o pioneiro Supermercado Peg Pag recém inaugurado a um quarteirão à Sears Roebuck próxima à sofisticada praça do Salgueiro Chorão, ponto inicial da então estritamente residencial Avenida Paulista, abrigo elitizado de mansões dos paulistanos quatrocentões.
Com poucos metros de extensão, com os passos rápidos e sincronizados, deixava a pinguela precária para trás, subindo pela trilha até a Rua Vergueiro. Ali, atento, sempre o mesmo guarda civil, de terno azul marinho, luvas e capacete branco semelhante aos Lanceiros de Bengala, apitava um silvo longo e ajudava os pedestres atravessarem, parando os automóveis e os bondes da linha Jabaquara. Uma escadaria larga, movimentada, com degraus cimentados era a etapa final. Nos altos, a Praça Santo Agostinho sede da Igreja e do Colégio no qual apreendia as primeiras letras.
O tempo passou: A Avenida Itororó saiu do papel tendo como nome 23 de Maio e a modesta pinguelinha cedeu lugar ao movimentado viaduto; o riacho canalizado segue subterrâneo retificado, a treze de Maio duplicada e asfaltada e São Paulo, então a doce e perfumada capital se transformou na indescritível maior metrópole dos trópicos. Distante no espaço e no tempo, no entanto, sua memória preserva com carinho e saudades o cenário de infância de seu berço natal. Parabéns São Paulo de Piratininga pelos 469 anos de sua fundação.!
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