A prepotência da
Magistratura. ( cultura brasileira )
A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal
Superior do Trabalho cassou determinação de remessa de documentos ao Ministério
Publico Federal para apuração de crime de desobediência de um cartório de
registros de imóveis que se recusou a registrar os imóveis arrematados em uma
hasta pública. A seção seguiu o voto do relator, ministro Emmanoel Pereira, que
deu provimento a recurso do Segundo Ofício de Registro de Imóveis de Ponta
Grossa (PR) para cassar a determinação imposta pelo juiz da execução.
A ação teve origem na arrematação de quatro imóveis numa hasta
pública. Expedida a carta de arrematação pelo juízo da 2ª Vara do Trabalho de
Ponta Grossa (juízo da execução), esta foi protocolada no cartório e, no
título, constava pedido de retificação dos registros dos imóveis, por não
haver, no registro anterior à arrematação, a área total dos lotes, já que se
tratavam de terrenos irregulares. As alterações solicitadas impediriam a
registro da carta de arrematação.
Passados dois anos, o título foi reapresentado ao cartório sem
que fosse suprida a exigência necessária ao registro. Houve ainda uma terceira
apresentação do título e nova recusa em proceder ao registro.
O cartório alegava que já haviam cessado os efeitos da
prenotação, prevista no artigo 205 da Lei 6.015/73 (Lei de Registros Públicos –
LRP). A prenotação é a anotação prévia e provisória de um título apresentado
para registro, pelo oficial de registro público. Outro argumento foi o artigo
213, item II, da LRP, que impõe a obrigação de registro por parte do oficial do
cartório no caso em que o requerimento do interessado for acompanhado de planta
e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado pelo
Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA), o que não teria ocorrido.
Diante da recusa, o juízo da 2ª Vara do Trabalho de Ponta
Grossa, onde corria a ação principal, determinou que o cartório remetesse cópia
das matrículas dos imóveis, sob pena de pagamento de multa diária e remessa de
ofício ao Ministério Público Federal para apuração de crime de desobediência à
ordem judicial. Contra este ato, o cartório e uma de suas serventuárias
impetraram mandado de segurança sustentando a impossibilidade de registrar a
carta de arrematação na matrícula provisória do imóvel, pois isso importaria em
transferência do domínio da propriedade. Sustentaram ainda que a determinação
judicial não revogaria a transcrição imobiliária em nome da executada. Pediam,
por fim, a exclusão da remessa de ofício ao Ministério Público para apuração de
crime de responsabilidade.
O TRT-PR considerou ilegítima a recusa do oficial do cartório e
rejeitou o pedido. Para o Regional, o cartório não poderia desobedecer à ordem
do juízo trabalhista, que determinava somente que se procedesse a registros
suscetíveis de adequação ou aprimoramento. O cartório e a serventuária
recorreram então à SDI-2 do TST, com recurso ordinário em madnado de segurança.
No julgamento da matéria na sessão dessa terça-feira (4), o
ministro Emmanoel Pereira considerou correto o entendimento do Regional de que
o oficial do cartório não deveria recusar-se a cumprir a ordem judicial
expedida pelo juízo da Vara do Trabalho. O relator destacou que, embora esteja
entre os deveres do oficial de registros públicos a verificação dos requisitos
extrínsecos do título imobiliário, é vedada a ele “a recusa em cumprir a
determinação do Juiz do Trabalho de registro da carta de arrematação”, porque a
decisão proferida tem qualidade de coisa julgada.
Entretanto, a remessa das cópias para o Ministério Público
Federal para apuração de crime de desobediência, previsto no artigo 330 do
Código Penal, deveria ser cassada. O relator fundamentou sua decisão em
precedente do Supremo Tribunal Federal, de relatoria do ministro Marco Aurélio,
no HC-85911, no sentido de que o cumprimento do dever imposto pela Lei de
Registros Públicos não é ato passível de enquadramento no artigo 330 do Código
Penal, “pouco importando o acolhimento, sob o ângulo judicial, do que
suscitado”. A decisão foi unânime.
A noticia trazida simboliza de um lado o despreparo de parte da
Magistratura brasileira, quer no conhecimento jurídico, político ou social e de
outro o despreparo psicológico que leva muitos a prepotência contumaz.
Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.brpresidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos –OAB-Sc
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