12 outubro 2013

Lourenço teicultor. ( memória nº 29 )

memórias nº 29
Sitio Morumby

 
O litoral sul do Estado de São Paulo se manteve isolado por longos séculos. Foi desbravado por faisqueiros garimpadores que subindo os rios se espalharam pelos vales e montanhas. Núcleos que se transformaram em municípios deixaram marcas do tempo épico da produção aurífera: Eldorado, pelo nome, Sete Barras, pelo naufrágio de barca que perdeu entre outros valores, 7 barras de ouro e até a Casa de Fundição que foi instalada em Iguape, na boca da barra do Rio Ribeira o mais importante elo entre o interior e mundo externo. Registro deve esse nome por dispor de repartição que registrava o tráfego de metais para o litoral. Lá era recolhido o imposto devido.

Depois desse período de garimpeiros,  a região foi desbravada por agricultores. Primeiro o arroz. Iguape ficou famosa na Europa pelo produto com atributos especiais de grande qualidade. A seguir a banana e o chá. Essa última cultura veio contrabandeada, escondida no miolo de pão, e implantada no interior do Vale do Ribeira pelos imigrantes japoneses se tornou mais uma alavanca da economia.

A ostra de Cananéia se transformou em marca. Sinonimo desse crustácio dada a fama e a qualidade. Lourenço se recorda que numa ida à Recife, viu uma placa informando o cardápio de determinado restaurante, que havia ostras frescas de Cananéia.

No entanto, a região era inóspita e isolada. A floresta Atlantica cobrindo a maior parte de todo o seu território e a falta de estradas  ficou até 1960, longe de tudo, quando o presidente Juscelino inaugurou a então BR 2 e o Ribeira foi redescoberto.

Dez anos depois guerrilheiros obrigaram as autoridades olharem para a região. Foi mais uma vez descoberto e surgiram inúmeras obras de infra estrutura, mostrando um mínimo de presença do Poder Pública.

Por determinação do ditador de plantão, o governador Laudo Natel se  obrigou asfaltar estradas, construir escolas rurais, ampliar o ramal da ferrovia até Cajati e dar assistência maior a região. Até criou a SUDELPA, autarquia que durante as décadas que existiu deu apoio aos paupérrimos municípios de lá.

Distante  60 km da sede municipal, o Ariri, foi alcançado por terra. Uma estrada foi aberta e hoje ainda é o leito que segue o trajeto da BR 101, ainda não implantada na região. A Caverna do Diabo foi iluminada e o terminal pesqueiro do CEAGESP foi inaugurado em Cananéia.

E nessa época Lourenço chegou ao Vale do Ribeira. Acreditou no potencial da região, ainda carente de tudo, situado  nas imediações de Sorocaba, Santos, São Paulo e Curitiba, com tudo para realizar. Uma região verde em todos os sentidos do termo.

Durante alguns anos rodou por lá. Notário em São Paulo conheceu investidores, fazendeiros, políticos. Se organizou de modo a ter na clientela, parcela considerável de loteadores da Ilha Comprida, Iguape, Cananéia, formando carteira diversificada de clientes e permitindo que mensalmente fosse à região levar escrituras para registro ou buscá-las.

Para esse fim travou amizade com os responsáveis do escritório de representação dos municípios de Iguape e Cananéia em São Paulo: Gaspar Silva e Wagner Piquelli que propiciaram bastante suas relações com loteadores, entre os quais Dr. Machado e Waldemar, proprietários do Balneário Varella, de Iguape, os quais o ajudaram bastante no início de sua advocacia.

Lourenço chegou a comprar um lote de terreno no empreendimento para que adquirisse confiança dos proprietários e assim tivesse a indicação para lavrar as escrituras  dos demais adquirentes.

O Vale na época recepcionava muitos aventureiros que se aproveitavam do povo ingênuo para os lograrem. Era quase uma terra de ninguém que sobre ela muita gente boa e má chegou de repente.

E ainda solteiro, Lourenço, investiu alguns trocados na aquisição de um sítio. Um japonês que plantava chá e abacaxi ia mudar para a cidade para dar educação aos filhos. Durante uns dois ou três anos, até as vésperas do casamento foi teicultor, vendendo as folhinhas do chá que produzia à multinacional Tender Leaf.

O sítio era no Serrote, bairro de Registro, próximo à divisa de Juquiá. Ao comprar, a primeira providencia foi dar ao imóvel, mandando averbar no registro imobiliário o nome que escolheu: Sítio Morumby.

Com quase quinze alqueires paulista, distante menos de cinco quilometros da BR 116, com energia elétrica na porta, o Sítio Morumby era ondulado, com nascentes no seu interior, aproximadamente quatro alqueires plantados de chá e duzentos e cinquenta mil pés de abacaxi, mortos e estragados, que o antecessor dera em penhor agrícola a um banco qualquer.

Havia uma casa que era bem modesta, próximo a um pequeno lago, num misto de estilo caiçara e japones rural, próprio da região. Essa construção foi destinada a um meeiro que Lourenço cedera para que, a par de explorar as folhinhas do chá, também cuidava da propriedade, evitando invasões ou ações de vândalos, que à época, por lá, não eram frequentes.

Lembra bem, que um de seus vizinhos era a fazenda da Cercal, uma empresa do mega empresário daquele tempo, o médico J.J. Abdala, condenado por corrupção que, numa visita ao Carandiru, na prática de estágio obrigatório, Lourenço o viu de uniforme destinado aos presidiários, solitário num canto do presídio. Lembrança triste e inesquecível.

Já casado, participou do GAP da Sudelpa, numa tentativa de colaborar no desenvolvimento da região. Grupo de Assessoria e Participação idealizado pelo Governador Paulo Maluf.

Chegou a implantar dois loteamentos em Iguape: Chácara Taiti e Chacara Haiti, no Rocio, próximo ao extinto campo de pouso. Conheceu muitos corretores de imóveis, entre os quais  Juca, de Miracatu, onde, juntamente com ele, montou um escritório, onde além da corretagem de fazendas, também regularizam a documentação imobiliária.

Enfim, Lourenço se dedicou bastante à região, aliando negócios particulares e ações para o desenvolvimento local.

Até hoje tem interesses e vive o Vale mesmo há mais de 500 km de distancia...
 
Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.br
presidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos –OAB-Sc
Membro da Academia Eldoradense de Letras
Membro da Academia Itanhaense de Letras
Titular da Cadeira nº 35 – Academia São José de Letras
Autor de Terrenos de Marinha e seus Acrescidos, Letras Jurídicas
Autor de Direitos das Coisas, Leud

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