Imposição ilegal de limites à fé pública notarial.
A função notarial é tripartite,
pois é una, harmônica e indivisível. Se ilegal, o tabelião não instrumentaliza,
tão pouco autentica. Se legal e não for instrumentalizada, a autenticação não
se completará. E legal, mesmo instrumentalizada, sem a chancela autenticadora
não estará aperfeiçoada.
O ato requerido pelo utente,
sendo legal na ótica do conhecimento apurado do tabelião, que o aprecia sob os
ângulos sociais e jurídicos pertinentes, será instrumentalizado, fixando a
seguir a chancela com o seu testemunho pessoal, tornando assim, completo e
aperfeiçoado o documento que será expedido sob sua responsabilidade.
Todo esse procedimento
resultará na saliente distinção, que o diferencia dos atos privados, praticados
por particulares outros ou dos de natureza pública, administrativos ou judiciários,
porque está envolto na fé pública notarial, revelando-se verdadeiro, sob a
garantia singular do próprio notário que assim atesta. Certifica em seu nome ao
portar por sua fé.
Valendo-se dos próprios
sentidos e do primado de seu conhecimento e experiência no exercício de sua
função, dá autenticidade, certeza e segurança às relações sociais, garantindo
pessoalmente por dispor de fé pública a verdade dos fatos chancelados.
Essa verdade limita-se a
certificar a manifestação que se fez diante de sua presença, pois o notário
autentica que o ato jurídico decorre de vontade expressa, que no seu juízo
privado, reconheceu como legal. Sua sensibilidade personalíssima é quem lhe
dita a permissão para atestar com segurança a certeza de portar por fé o que
testemunhou: Fatos ou atos.
Decorre pois, que o atestado
notarial deve estar acima de quaisquer suspeitas, pois se fundamenta na fé
pública que lhe foi outorgada legalmente e assim, na condição de seu delegado,
firmá-lo na certeza de sua veracidade, impondo de forma coercitiva ao corpo
social a crença de sua autenticidade até prova contrária.
Compete pois ao tabelião dar fé do que vê, ouve e sente, pelos próprios sentidos, assumindo a responsabilidade pessoal daquilo que vier atestar, cujos efeitos erga omnes, decorrem do tradicional e histórico instituto jurídico da fé pública, sempre indispensável nas relações das sociedades organizadas.
Nos tempos contemporâneos, as
Corregedorias de Justiças dos Estados, a quem cabe fiscalizar o serviço dos
delegados notariais, determinam por justificativas diversas, sejam opostos
selos, numerados atos e outras formalidades burocráticas que fogem ao âmago da
função notarial acima resumidamente exposto. Certificações, atestados, atos
diversos, até então grafados mecanicamente e subscritos pelos notários aos
poucos, nos centros mais adiantados estão sendo substituídos por meios
eletrônicos, de modo que num único lance, o ato é numerado, estampado o selo
fiscal e informado o horário de sua prática à autoridade judiciária competente.
Os velhos carimbos estão sendo substituídos por pequenos artefatos, que lembram
as máquinas de cobranças de cartões de créditos.
Ocorre que a fé pública
notarial é pessoal, valendo a expressão confirmatória do tabelião através de
sua chancela, nos atos que instrumentaliza ou autentica, para configurar o seu exercício.
Não será o velho carimbo da idade média ou o apetrecho eletrônico do século XXI
que certificará o testemunho da verdade. Nem o recolhimento de tributos
decorrentes da prática do ato, que o autoriza, posto que é o personalíssimo
testemunho da verdade que enseja e qualifica essa função tão relevante e
indispensável para o corpo social.
Assim, na falta de energia
elétrica que paralisa o mecanismo desses carimbos eletrônicos ou na
impossibilidade de se recolher do mesmo modo os selos comprobatórios exigidos
pelo fisco ou emanados de ordens administrativas dos Tribunais Corregedores,
não há porque impedir o exercício da fé pública, desvirtuando todo o sentido da
função notarial. O notário brasileiro não é agente administrativo, com
limitações cogentes, impostas por superiores.
No entanto, essa prática
equivocada emanada dos Tribunais tem se repetido, assimilada por Notários que
abdicam da prática de suas funções, tolhidos por provimentos calhordas, que
revelam antes de tudo, despreparo das autoridades autoritárias a par da
fragilidade e desconhecimento dos que se submetem ao grifo dessas medidas
adequadas aos burocratas na esfera hierárquica.
Enfim, insta asseverar que a
fé pública notarial, personalíssima por excelência, subsiste à prática de
formalidades, limitada apenas ao testemunho da verdade dos órgãos delegados da
fé pública. Formalidades burocráticas podem ocasionalmente serem adiadas e
posteriormente cumpridas e ratificadas, evitando elevados prejuízos sociais.
Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.br
( Autor de Direito Notarial
Brasileiro. Leud, 1989 e outras obras jurídicas. )
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