O conteúdo das palavras.
Algumas pessoas falam muito.
Falam bastante. Falam sem parar. Todos os temas e todos os assuntos a
versatilidade do conhecimento os propicia a falar. Consideram-se especiais.
Melhores, superiores, importantes. Sabem tudo.
Falar, falar, falar sem
parar. Falar pelos cotovelos, joelhos e orelhas. Falar sentado, em pé,
pilotando barco, avião ou automóvel. Falam até sentados na roda-gigante.
São tagarelas de plantão.
Encontramos esses linguarudos
em todos os cantos e, sem qualquer pudor, sofremos o despejo incansável de
intermináveis locuções, na maioria das vezes inoportunas, desconexas e sem
conteúdo. São histórias que não nos interessam e também a qualquer outro
ouvinte. São detalhes e minúcias enfadonhas despidas de raiz que encaminha ao
tédio. São falas sem fim.
Falam tanto que no meio da
fala mudam de assunto e desenvolvem outras mensagens que faz do dialogo proposto
uma confusão de explanações cujo início
se perde e o fim nunca chega. Cansativo ouvir o falante.
Falam sem cessar. Sem cansar.
Nem bebem água. Não abrem pausa para o
dialogo. Falam e não escutam. Mandam. Opinam, questionam e respondem. Não conhecem vírgulas, ponto-e-vírgulas,
exclamações ou reticências. Interrogações não tem respostas por falta de tempo hábil e
travessão... Não existe travessão,
aspas, parêntesis ou colchetes. Não concedem à parte.
Tédio do lero-lero daqueles
que falam próximos; dos que falam de longe e de todos que falam sem parar. Tem
aqueles que entram em êxtase quando vislumbram um microfone e os que também
discursam por telefone. Tem os que falam
e gesticulam alto. Tem os que falam mais alto e aqueles que gritam.
Tem também os que falam de
pressa e os que balbuciam de modo inteligível, baixinho e sem parar, num ritmo
inadequado para prender a atenção. Falam morno provocando sono que vira o
prenúncio do pesadelo da antevisão de
monólogo que se perde no espaço. Esses falam chochos e mórbidos.
Resmungam sem parar e sem emitir som. Falam para dentro. Difícil ouvir sem ter
interesse no assunto.
Uns falam com quem conhecem e
falam com desconhecidos. Para esses, o importante é falar sem se dar conta de quem
ouve. Falar com a boca molhada, insalivada agredindo com cuspes e babas meladas
ensopando aos que, enojados se afastam e são perseguidos. Pegam no braço, puxam
e exigem que estejam próximos à boca molhada e gosmenta de tanta fala. E quando
o falante sofre do estomago o mau hálito torna o ambiente pior. E o azedo do
pinguço então torna inebriante e zonzo o discurso ébrio interminável...
Outros se esquecem e falam
tomando café, comendo macarrão ou degustando sopa de cenouras. Por óbvio, esses
falantes sem o mínimo de respeito e desconhecendo boas maneiras, sempre se
engasgam, tossem, sujam a mesa, a toalha e os demais convivas que, suportam a
fala e a bagunça.
São falantes que se impõe
através das cordas vocais esganiçadas, roucas ou tenebrosas. Também tem os
falas-finas. Homens que na puberdade ainda falam como crianças. Tem mulheres
que falam grosso. Outros espirram e
continuam falando e se limpando.
São tribunos decadentes e
frustrados que se consideram mestres, sabidos daquilo que todos sabem. Vazios e
desprovidos do senso abalizado comportamental, não se importam no egocentrismo
de seus monólogos se os ouvintes pacientes que o assistem se mostram ou não
satisfeitos. São ejaculadores de sons nem sempre ouvidos, se quer perceptíveis
dada a futilidade insonssa e desbotada, desprovida de qualquer saber. Suas frases
se transformam em orações e estas em intermináveis discursos, onde sem pausa, ditam saberes inerentes ao nada do que
produzem.
Falantes que transformam a
conversa em sermões. Dão broncas intermináveis. Fazem citações de locuções
tiradas de alguma enciclopédia utópica só para revelar a pobreza do próprio saber.
Também, aproveitam ocasiões que surgem no dia a dia de qualquer pessoa e rasgam
elogios quando poderia ser um simples muito obrigado. São malucos entorpecidos
pelo próprio som. São os que sonham e os que narram pesadelos. E ainda tem aqueles que perguntam: - Sabe o
que me lembrei agora?
Anônimos, esses locutores desejam
tribunas nas quais possam ditar suas ideias e à semelhança de Vargas, Peron, Alfredo Stroessner, Fidel Castro e outros
caudilhos latinos, fingem que não escutam e disfarçam impedindo que saiam de
sua volta àqueles que, ora por respeito, ora por educação, suportam ouvi-los.
São egocêntricos, egoístas e catequizadores do nada.
Enfim, é preciso lembrar que
a evolução da espécie humana dispôs a humanidade de dois ouvidos e uma única
boca para serem utilizados na proporcionalidade e moderação. Monólogo é
conversa de ermitão diante do espelho. Ninguém é obrigado a suportar.
Exceção à puxas-sacos, subordinados
e subalternos, nessas ocasiões resta
disfarçar e de fininho fugir. Sumir para não ouvir mais ninguém.
Roberto J. Pugliese
Autor
de Direito das Coisas, 2005, Leud
Titular
da Cadeira nº 35 da Academia São José de Letras.
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