1) Introdução. O jornal O Estado de São
Paulo publicou na sua edição de 13 de novembro de 1983 artigo que subscrevi a
respeito do paradisíaco arquipelago onde se encontra situada emoldurada ilha do
Cardoso, através do qual denunciava arbitrariedades que então se materializavam
nos confins do litoral paulista.
Àquela época o litígio envolvendo a
Fazenda Pública do Estado de São Paulo e interesses dominiais da União Federal
já arranhavam direitos mínimos elementares da população local, da Fazenda
Pública Municipal de Cananéia, dos proprietários de casas e sítios de recreio
entre outros.
Ao longo dos anos, daquela para esta data, após
burocráticos e morosos trâmites, o Supremo Tribunal Federal declarou, pertencer
à União Federal as ilhas que integram o singular arquipelago ignorando a posse
politica tradicional e histórica exercida pelo Estado de São Paulo, advinda de
ocupação por séculos, inclusive exteriorizada por atos jurídicos,
administrativos, políticos, obras e serviços públicos implementados pelo governo
do Estado e do municipio e assim também por particulares, ajuntando-se a gama
valiosa de comprovação dominial, possessória e política.
Àquela época o
Parque Estadual da Ilha do Cardoso – Peic, criado pelo governador Carlos Alberto
de Carvalho Pinto através do Decreto estadual paulista nº 40.319 já era
realidade e estava sendo implantado, tornando-se atualmente unidade de
conservação modelar.
Diversas obras ao longo dos anos foram executadas
no território insular e nas ilhas menores que integram o Peic e, para a efetiva
concretização do projeto preservacionista de ambito cultural tão audacioso,
medidas outras, especialmente de natureza administrativas foram ultimadas,
provocando sem número de atos injustos, alguns radicalmente autoritários e
contrários ao bom direito.
Nos 46 anos de concretização daquela unidade
de conservação a segurança jurídica e o ordenamento regular foi cotidianamente
esquecido, prejudicando ora investidores, ora veranistas, ora ilheus que nem
sempre puderam se valer de garantias jurídicas constitucionais para a defesa de
seus direitos.As histórias de violencia contra as pessoas e o patrimonio
particular, perpetradas arbitrariamente pelas autoridades responsáveis pelo Peic
são ainda hoje repetidas constantemente.
2) Aspectos naturais do
Peic. Com exclusão expressa dos terrenos de marinha, o Peic compreende a
integridade das Ilhas do Cardoso,da Casca e outras menores adjacentes e
despovadas na costa sul de São Paulo.
A ilha do Cardoso, maior do
arquipelago, é coberta no seu interior setentrional pela floresta atlantica e
suas bordas são revestidas por manguezais nas faces voltadas para o continente e
paradisíacas praias e portentosos penhascos junto ao mar aberto. A topografia
predominantemente montanhosa ao norte e ao centro, com planices costeiras nas
bordas lindeiras ao Canal de Ararapira, tem um estirancio arenoso de grande
desenvolvimento para o sudeste, constituindo a restinga existente entre a ilha
do Superagui, no litoral do Paraná e o Oceano Atlantico. Tem abundancia de
cursos de água, com inúmeras cachoeiras e saltos, e incontáveis lagoas de águas
mornas e salobras perdidas no seu interior. Estudos geológicos afirmam que
trata-se de projeção da Serra do Mar, desligada do continente por movimento
tectonico remoto.
Ali afloram as matas pioneiras de dunas; as formações
de restinga; a floresta pluvial tropical da planice litorânea, a floresta
tropical da Serra do Mar e a vegetação de mangue. No arquipélago é encontrado o
jatobá, a copaíba, o cedro e o jequitibá, o tapiá, a figueira branca, o
palmito-juçara, jerivá entre tantas espécies que formam a cobertura vegetal .Os
valores de produção para os bosques de mangue nas ilhas ali situadas são
catalogados entre os ecossistemas mais produtivos do mundo, contribuindo
sobremaneira para a produtividade pesqueira das águas que rodeiam o PEIC e
igualmente todo o Lagamar. A fauna exuberante tem um acervo de 436 espécies de
aves.
Dessa fartura decorre a presença constante de animais que
frequentemente visitam o lugar para se alimentar ou cumprir o ciclo da vida,
como se dá com os camarões e as diversas espécies de botos, inclusive o cinza,
as espécies de tartarugas marinhas já em extinção no hemisfério sul e outros
ameaçados igualmente, endemicas ou raras, como são o mono-carvoeiro, o papagaio
da cara roxa, a jacutinga, o jacaré de papo amarelo, o jacu-guaçu, a
onça-pintada, o veado-mateiro, entre outras que tem ali seu habitat natural ou
mesmo a visita constante.
Algumas espécies tem sido observadas e objeto
de estudos há muitos anos, salientando-se o morcego, o pássaro
maria-da-restinga, a saracura-do-mangue e o mico-leão-de-cara-preta-do
mangue.Aves migratórias vindas dos Andes e dos Estados Unidos da América também
aportam regularmente no interior da ilha do Cardoso, sendo que o beija-flor
orinundo do Mato Grosso constitui parcela consideravel todos os anos de
visitantes regulares.
Nesta quadra vale registrar que o Peic foi
instituido com o principal objetivo de proteger sua valiosoa fauna, flora,
praias e demais expoencias naturais,que constituem um rico patrimonio ambiental.
3) Aspectos culturais do Peic. Há inúmeras evidencias que a
região fôra cobiçada e servia de palco para civilizações que deixaram marcas
cuja importancia exige sua preservação. Há registro de que navegadores europeus,
entre outros Américo Vespuccio, André Gonçalves e Cristovão Jacques, passaram
pelo arquipelago antes de Martim Afonso de Souza, inclusive nela aportando antes
da presença cabralina no litoral da Bahia.
Os casqueiros situados em
pontos à beira mar revelam a presença humana nos primordios da história ...
Essas formações artificiais são testemunhos da presença humana imemorável
naquele arquipelago. Nesse sentido, impõe-se registrar que entre tantas a Ilha
da Casca, destituída de água própria e a ilha do Berbigão, devem sua formação
aos chamados restos de cozinha, ou seja, pequenas formações artificiais
constituídas por conchas, ostras, mariscos e frutos do mar generalizados, que
constituem sambaquis No interior do Parque existem também jazidas pré-históricas
que comprovam a presença na região do primitivo homem americano há
aproximadamente quinze mil anos atrás, com marcas indeléveis ali deixadas.As
inumeras cavernas e grutas outroras habitadas comprovam a assertiva.
Através de Resolução do Conselho de Defesa do Patrimonio Histórico,
Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado – Condephat, a ilha foi incluída
na área objeto de tombamento da Serra do Mar, conforme resolução nº 40/85.
Integra a Reserva da Biosfera da Mata Atlantica, consoante deliberação da Unesco
de 1991 e por resolução da mesma agencia da ONU, em 1999 foi declarada Sítio do
Patrimonio Natural Mundial.
Entre outros marcos culturais no Pontal do
Itacurussá, na extremidade nordeste da ilha do Cardoso, foram encontrados os
Padrões de pedra com as armas Lusitanas erguidos pelos primeiros descobridores,
demarcando o território pertencente a Portugal em razão do tratado de
Tordesilhas. Réplica desta testemunha foi ali erguido, já que os origináis foram
levados para o Rio de Janeiro.
Na extremidade norte da ilha foi
instalado o Centro de Pesquisas Científicas que tem papel fundamental no
desenvolvimento de projetos de estudos dos mais variados, concretizando a
finalidade institucional do Peic.
O patrimonio antrópico é bastante
singular, com caiçaras mantendo a tradição de seus antepassados, na engenharia
de cercos de varas de bambus para pesca, valendo-se de vocabulário próprio
fluente na região, com expressões indetidas faladas desde o início da
colonização e ainda mantendo-se compreensivas entre os habitantes do lugar. No
interior do PEIC são mantidas vivas festas religiosas tradicionais. Importante
manifestação cultural popular, que reúne dança, música e regras estéticas
próprias, com características especificas regionais, com grande variação de
estruturas musicais e coreográficas, que tornam a arte peculiar, rica e variada
é o Fandango, também praticado no arquipélago e adjacencias.
Na
atualidade vivem no interior da ilha do Cardoso aproximadamente 600 pessoas,
caracterizadas por ocupantes tradicionais, turistas, indígenas e funcionários
públicos espalhadas pelas comunidades do Cambriu, Foles, Ipanema, Pontal do
Leste, Enseada da Baleia e do Marujá, a maior delas. No Pererinha, se encontram
os laboratórios e centro de presquisas cientificas. A usina hidroeletrica, que
aproveita o represamento artificial do Pereque, um pequeno ribeirão que desce as
encostas da Serra Cardoso, se encontra em estado de total abandono e por erros
de engenharia nunca chegou a funcionar. Os Guaranis, vindos do Paraguai e do
Mato Grosso ingressaram e se instalaram nas imediações ao norte da ilha do
Cardoso em 1992.
Atualmente a ilha é frequentada, consoante permite a
legislação, por cientistas, professores, pesquisadores, estudantes e
funcionários públicos que visitam e se hospedam na Centro de Pesquisas e por
turistas que assistidos por monitores acampam ou hospedam-se principalmente nas
comunidades situadas na extremidade sul da ilha do Cardoso.
Vale
salientar que o Peic foi idealizado pelo professor Paulo Duarte, da Universidade
de São Paulo, para servir de tutela socioambiental do complexo insular, de forma
a conter as ações e os empreendimentos imobiliários iniciados tempos antes e
assim paralisar imediatamente a exploração de sambaquis, da fauna e da flora;
estabelecer um centro de estudos da Comissão de Pré-história e uma estação de
pesquisa do Instituto Oceanográfico da mesma universidade .
Sem exagero
a ilha do Cardoso atualmente é referencia internacional.
4) Gestão
administrativa do Peic. Com apoio na legislação federal, o Peic dispõe
de estatuto moderno e democrático de administração, consituido por órgão gestor,
no qual inclui-se entre os membros, representantes da administração pública, da
sociedade civil e das comunidades existentes no interior do parque.O
administrador, agente público nomeado pelo Governador do Estado, trata-se de
funcionário do Instituto Florestal da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, a
quem compete , limitadas a ações administrativas, as funções de execuções
deliberadas pelas reuniões do órgão gestor.
Os raros proprietários de
imóveis que não são considerados habitantes tradicionais não são representados
no colegiado, constituindo-se lacuna saliente, que fragiliza a manifestação
democratica proposta. Assim também, aos indígenas ou seus representantes, não
foi dado espaço.
Todas as atividades no interior do Peic são autorizadas
ou proibidas pelo aludido conselho administrativo e fiscalizadas pelo dito órgão
gestor com apoio da Polícia Ambiental e outros agentes públicos, inclusive os
guardas-parque.
Nessa quadra insta salientar que sendo patrimonio da
União Federal, assim reconhecida através dos Acórdãos nº. 315-6 e nº 317-2
proferidos pelo Supremo Tribunal Federal,a ilha do Cardoso e as demais que
constituem o arquipelago, assentam o Parque Estadual, conforme acordo firmado
entre os governos federal e do Estado de São Paulo, cabendo a este o pesado
munus de manter a sua posse jurídica, valendo-se dos meios legais, inclusive
arcando com os onus decorrentes das desapropriações das propriedades
particulares ali situadas e demais obrigações que eventualmente decorram da
situação jurídica singular que se observa.
O Estado é dono e não é dono.
Tem obrigações severas e a titular do dominio que é a União, em nada contribui
para a existencia do Peic e coexistencia daqueles que ali tem interesses
culturais, cientificos ou financeiros. A União é omissa em relação ao
arquipelago, apenas reservando para si a propriedade daquele território.
5) Aspectos sociologicos do Peic. O Parque estadual da Ilha
do Cardoso constitui-se num território paradoxal, alheio ao ordenamento jurídico
e político do país, provocando inúmeras situações irreais, que geram o injusto
para a sociedade local, para os Poderes Públicos e para muitos dos que ali tem
os mais diversificados interesses.
A maioria dos moradores imigrou.
Deixaram tudo para traz e foram viver longe das ilhas e do parque. Partiram para
a sede municipal ou para cidades lindeiras da região. Alguns chegaram em
Santos,outros em Paranaguá ou Curitiba. No ABC há contingente expressivos de
ilheus. Despreparados e fora do ambiente que lhes é próprio foram marginalizados
e encontram-se discriminados por não interagirem com os meios urbanos. Poucos
foram bem sucedidos nestas aventuras que foram coagidos a empreenderem desde os
anos setenta.
Os habitantes daquelas ilhas, especialmente do Cardoso,
que por teimosia ou medo se negam a deixarem suas posses ou propriedades
tradicionais, foram repentinamente obrigados a mudarem seus hábitos,
transformando-se em pescadores artezanais, prestadores de serviços ou
comerciantes, visto que suas roças e práticas ruriculas tradicionais, como a de
coletores históricos, é terminantemente proibida.
A pesca artezanal,
assim como as demais atividades típicas do lugar, não é o bastante para o
sustento desses ruriculas. Desse modo, o morador tradicional da ilha que ficou
se transformou nos ultimos anos em miserável que vive de forma indígna, roçando
as escondidas, caçando e pescando para o sustento próprio e dos agregados. Vivem
a semelhança daqueles que sairam e, igualmente são desprezados no seio da
sociedade que integram.
Os poucos comerciantes sucessores de várias
gerações que os antecederam e que ali ainda residem, na condição de habitantes
tradicionais, rumaram suas atividades economicas para o aluguel de espaços para
acampamentos de turistas ou modestas pousadas. Alguns alugam casas para
turistas. Outros mantém embarcações de recreio, que servem para o transporte ou
para pesca recreativa. Há também emporios, restaurantes e bares espalhados por
algumas das comunidades, porém humildes e toscos, inibindo a possibilidade de
rendas apreciaveis.
Interessante salientar que esses estabalecimentos,
admitidos pelo Conselho Gestor do Parque, não tem qualquer registro nas
repartições fiscais municipal, estadual e federal.Se quer alvará de
funcionamento são expedidos pela Prefeitura Municipal da Estancia de Cananéia.
Não há fiscalização consolidando-se paradoxo singular no qual os Poderes
Constituidos homologam sonegação fiscal entre outras ilicitudes.
Os
habitantes tradicionais são catalogados sem qualquer critério jurídico objetivo.
Os que ali nasceram são assim considerados e detem, consoante o plano de manejo,
permissão para continuarem em suas moradias. Outros, também naturais daquela
ilhas, porém não mais residindo por lá, tem seus imoveis condenados a demolição,
não lhes sendo reconhecida a referida condição antropológica. Outros, estando
fora, mas por serem filhos naturais do arquipelago e as visitando com
habitualidade, tem permisão para manterem os prédios que ocupam na exploração
comercial. Há também os que ali habitam na condição de imigrantes que chegaram
antes da criação jurídica do Peic. Outros, posteriormente, mas permanecem
instalados, por terem algum vínculo com terceiros autorizados. Enfim, uma
confusão injusta que favorece os que se impõe. Decorre que o arbítrio substitui
a lei.
A população local, de um modo geral, não ve com bons olhos, os
raros turistas, que restaram, proprietários de imóveis que mantem para lazer.
São vistos pelas autoridades como perigosos depredadores. Alguns habitantes os
consideram concorrentes, pois deixam de frequentar os camping e pousadas,
provocando prejuizos. Muitos já foram condenados a derrubarem esses predios sob
o argumento de que o meio ambiente foi agredido quando ergueram essas
construções. Todos são proibidos de reformar essas casas, pois o Órgão Gestor
não autoriza.
Outro sério conflito paradoxal se dá com alguns imóveis
construídos anteriormente a criação do Peic. Passados meio século, estão
precisando de reformas, as quais não são autorizadas, porque estes proprietários
não são considerados habitantes tradicionais. Sob esse argumento e de que o meio
ambiente é agredido com a construção, não obtem autorização e as construções
estão se deteriorando provocando prejuizos aos seus donos e ao meio ambiente,
que após longas décadas, já se climatizou e se adaptou a existencia desses
edificios.
Há turistas que frequentam a ilha há mais de cinquenta anos.
Seus pais já frequentavam quando o parque ainda não exsitia. São cuidadosos com
o meio ambiente e convivem com os moradores numa harmoniosa e saudavel vivencia,
decorrente de tantos e tantos anos de recíprocos interesses e já amizades
consolidadas. No entanto, o Poder Público por intermédio do Órgão Gestor, da
Administração do Parque, do Ministério Público e pressionado pela opinião
pública, entende que mesmo nestas condições, não há possibilidade de permanencia
desses no Peic, por contrariar a lei e agredirem o ambiente local.
Há
diversos equivocos generalizados das pessoas que comandam os destinos da ilha do
Cardoso e adjacencias.
6) Ações demolitórias e outras medidas.
Justificando a indispensável necessidade de recuperação ambiental de
forma a implementar-se o ambiente natural do Peic, modificado ao longo dos anos
pela ocupação antrópica, inicialmente apenas dos habitantes que lá se
instalaram, o órgão gestor tem impedido a promoção de reformas de prédios
pertencentes a terceiros que não habitam as ilhas e determinando a derrubada de
construções e a recuperação da flora natural alterada.
De um modo geral,
essas determinações radicais, de inegável contornos autoritários estão sendo
ignoradas, provocando denuncias ao Ministério Público Regional Ambiental que,
reconhecendo justiça no pleito, tem acatado e promovido ações civis públicas
direcionadas aos proprietários, aos possuidores e aos ocupantes de prédios ali
situados, em especial aos poucos turistas que ainda mantém residencias, sem
distinguir a origem e eventuais direitos previamente adquiridos, muitas vezes,
anteriormente a 3 de julho de 1962 quando da assinatura do Decreto de criação do
Peic.
Impedem também que caiçaras tradicionais ampliem seus negocios
para evitar o aumento do fluxo de turistas, provocando de um lado, estagnação
economica e de outro, desqualificação das condições para melhor exploração do
turismo, cujo potencial é reconhecidamente elevado.
O foro judicial de
Cananéia tem inúmeras ações cujo objeto é a derrubada de construções e outras
medidas inibitórios do uso e obrigações que visam a restituição da flora e do
ambiente natural.
Ajunte-se ao breve relato que famílias constituidas
por nativos e imigrantes quando se separam, partilham seus imóveis que ocupam a
justo título, atribuindo-se costumeiramente a mulher e a prole, a sua
permanencia, contrariando as regras internas do Peic, quando estas não são de lá
naturais e provocando a paradoxal situação do ilheu não poder erguer nova
habitação, por ter historicamente a primeira, ainda que atribuida a ex conjuge.
Agora, surge a determinação de que os habitantes da Enseada da Baleia,
deixem suas casas e se desloquem para outra localidade determinada pela
administração do parque, visto que a erosão está provocando danos ambientais. No
entanto, impõe a esses caiçaras que ergam apenas construções padronizadas,
ignorando-se o atual patrimonio imobiliário que dispõe, v.g. pousadinhas,
pequenos camping e construções para habitação própria e locativas que não
poderão ser re-erguidas.
Enfim, o caos social se implantou na ilha do
Cardoso.
7) Conclusões. A ilha inegavelmente deve ser
preservada. O parque, sem dúvida, igualmente deve cumprir o seu objetivo
institucional e também ter preservado o seu patrimonio turistico, artistico,
arqueológico, histórico, natural e paisagistico entre tantos outros que
constituem tão rico dominio. O arquipelago, no todo de suas incontáveis ilhas e
ilhotas, assim também os canais, rios, manguezais e floresta atlantica que
compõe o dadivoso quadro cujo eco-sistema faz da região do Lagamar, na qual
integra o Peic, menina dos olhos da Unesco, igualmente deve permanecer sob
cuidados especiais, dada as condições já expostas.
Ninguém em sã
consciencia se insurge contra a preservação ambiental do Peic, do Lagamar e do
Vale do Ribeira, porém, algumas ponderações devem ser ponderadas, face as
arbitrariedades que se constatam ao longo dos últimos 46 anos, em nome da
preservação histórica e ambiental do lugar.
O eco-sistema de qualquer
lugar deve ter como sustentação o ser humano que o integra. Seus valores
materiais e imaterias integram e compõe o meio ambiente. Não se pode permitir
interpretar-se a presevação da natureza excluindo-se dessa composição o ser
humano, por mais devastador que tenha sido e que ainda, lamentavelmente, o é em
certas ocasiões.
A ilha do Cardoso durante séculos, sem qualquer exagero
nessa contagem, comprovadamente foi habitada e explorada por ruriculas que lá
mantinham suas fazendas, roças e engenhos, sendo certo que no ínicio do sécula
XX, a população local superava a séde municipal, em razão das melhores condições
naturais ali apresentadas.Trata-se de realidade histórica que não se permite
esconder ou desprezar, que por si já é o bastante para integrar qualquer
politica preservacionista, posto que os agentes humanos que lá viveram e a
exploraram, passados tantos séculos, a mantiveram intacta, de forma a
considerar-se estes agentes naturais verdadeiros, próprios e os melhores
guardiões de tão rico tesouro ecológico. Nesse sentido, insta lembrar que os
guardas-parques do Peic são constituidos por moradores ou ex moradores
tradicionais do arquipelago.
De outro lado os habitantes naturais que
são dali originários e tradicionais não podem ser simplesmente alijados de seus
espaços, com rompimento de suas culturas e expropriados de maneira arbitrária,
de modo a incentivar o esvaziamento populacional do Peic. Tão pouco, não serão
indenizações vis, mau avaliadas, que permitirão qualquer ação justa no sentido
apontado. ALiãs, os habitantes tradicionais não tem interesse de serem
indenizados, pois sabem que não dispõe de condições para enfrentamento da vida
alem das fronteiras do Lagamar. Esses últimos caiçaras que estão resistindo a
todas as pressões para sairem das comunidades que habitam nas diversas ilha tem
consciencia da impotencia e ausencia de condições para sobreviverem dignamente
noutros lugares.
Se a especulação imobiliária que teve inicio no segundo
quartel do seculo passado poderia provocar a violação desses valores ambientais,
com a criação do parque e sua paulatina implementação, foi estancada e nesse
aborto economico, o Estado de São Paulo, de forma pioneira, houve cumprir seu
papel institucional evitando a degradação que inevitavelmente se daria. Situação
que de um lado merece aplausos mas que não permite abusos e arbitrariedades ora
denunciadas. Notadamente abusos institucionais e de autoridades menos preparadas
para os cargos que ocupam.
No entanto, é indispensável que seja
aquilatado situação fática em relação aos turistas que investiram em imóveis na
região do Lagamar. Alguns pioneiros que aquela época, vencendo inúmeras
dificuldades inerentes as distancias das ilhas e dos centros urbanos, a situação
de quase completo isolamento pela falta de meios adequados de transportes e de
comunicações, resolveram investir em pequenas propriedades imobiliárias para
seus lazeres e descanso não podem ser penalizados e assim, impedidos de manterem
seus imóveis adquados ao uso, notadamente porque não estão violando regras
jurídicas ou da natureza.
Esses turistas que investiram em casas de
veraneio há mais de cinquenta anos se ao as erguerem provocaram danos
ambientais, esse tempo, fez com que a propria natureza se recuperasse e
corrigisse a violencia e se adaptasse as condições que hoje se constatam. A
demolição desses prédios, provocará cinquenta ou mais anos depois, agressão
maior do que se estes imóveis permanecerem erguidos e em bom estado de
habitabilidade.
Ademais o absurdo é impedir o acesso a esses imóveis e
se quer observar-se o direito adquirido e o direito a indenização decorrente da
expropiação que vem ocorrendo há boa data.
Ajunte-se também que é
preciso distinguir-se dentre os poucos prédios existentes, aqueles que foram
erguidos após a instituição do Peic dos que já se encontravam prontos e
habitados antes dessa unidade de preservação existir. Não se permite entender
que aquele que frequenta a ilha há mais de trinta anos, não seja considerado
habitante tradicional. E o pior, o culpe pela degradação ambiental do
mundo...Muitos desses investidores, originários de outros lugares, ao
aposentarem-se foram residir em definitivo no interior do Peic e, em harmonia
com a prodigiosa natureza, sem qualquer ação depredadora, vivem há mais de
trinta anos no isolamento da ilha do Cardoso e estão sendo pressionados a
mudarem-se.
Quem não se adapta a sociedade rústica jamais investiria na
ilha do Cardoso. Esses poucos moradores, que pelo tempo, já se tornaram
habitantes tradicionais, não tem mais como retornarem a vida urbana.
Enfim, passados tantos e tantos anos, o caos jurídico é a realidade que
se constata, que reduz a arbitrariedades das mais variadas contra aqueles que
mantem interesses no Peic.
E a par dessas medidas mais demagógicas do
que práticas o próprio Peic viola a lei e agride a natureza, construindo
barragem e hidroeletrica. O Poder Público, abre espaço no seio da floresta
atlantica no interior da Serra do Cardoso, para abrigar os indígenas que não são
naturais e tão pouco mantém qualquer relação histórica com o arquipelago. Essas
duas ações obradas pelo Peic são suficientes para desabonar a boa intensão que
se manifesta em expulsar o turista e o habitante tradicional em homenagem a
defesa ambiental e da legislação pertinente.
Ademais, para coroar com
chave de ouro a situação absurda que se constata por lá, é preciso lembrar que a
Constituição Federal, consoante dispõe o texto extraido dos artigos 20 e 26,
reconhece o dominio das ilhas oceanicas e maritimas de terceiros, dos municipios
e dos Estados quando, anteriormente a sua promulgação já se encontravam sob suas
posses ou propriedades. Decorre pois, que o Estado de São Paulo e o municipio de
Cananeia se omitem em pleitear a titularidade dessas ilhas que, contrariamente
as evidencias, são reconhecidas como proprios da União Federal.
Se no
passado o STF julgou a ilha pertencente ao dominio da União, com a Carta
Primavera, há condições do Estado de São Paulo principalmente e também o
municipio de Cananeia reivindica-la por ser ato pertinente as respectivas
competencias materiais dessas unidades politicas. No entanto, nada nesse
sentido, se fez, mesmo passados 20 anos da promulgação do diploma politico
aludido.
Passados assim tantas décadas, resta denunciar mais uma vez ao
Jornal O Estado de São Paulo, que se valha de sua respeitabilidade e
independencia e divulgue amplamente os fatos que na região do Lagamar e em
especial na Ilha do Cardoso estão se sucedendo de modo radicalmente arbitrário,
sob os olhares das mais variadas e altas autoridades. Talvez será o único
instrumento que provocará o clamor social e a repercursão indispensável para que
se mude a situação e a politica preservacionista injusta ali disposta.
Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.br
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