Inadimplência generalizada, escolas sem
professores, profissionais da saúde sem receber, suspeitas de desvio de verbas
e ausência do poder do Estado. Os problemas acima poderiam se enquadrar com
maior facilidade na realidade de diversas médias e pequenas cidades
brasileiras. Mas, na verdade, eles compõem o retrato de uma capital com mais de
400 mil habitantes.
Fincada em uma área de difícil acesso
na região amazônica, Macapá se torna quase uma ilha isolada dos grandes
centros. Logo, seus problemas também passam despercebidos no restante do
Brasil. A capital do Amapá vive uma grave crise de inadimplência em diversos
serviços públicos básicos, que se agravou após a derrota do prefeito Roberto
Góes (PDT) nas eleições municipais de outubro para Clécio Luís (PSOL).
Desde então, a prefeitura demitiu
diversos servidores da educação, desde profissionais de limpeza a professores,
que tinham contratos administrativos. Na área da saúde, apesar de repasses
federais chegarem para a manutenção de programas de assistência social, uma
parcela extensa dos funcionários do setor não recebe os salários há meses.
O Ministério Público Federal foi
impelido a agir para tentar solucionar o problema, descrito pelos procuradores
da República como “um desmonte generalizado” e “descaso com a coisa pública”.
O órgão conseguiu na Justiça Federal,
na última semana, o bloqueio das contas da prefeitura referente aos valores
recebidos por todos os programas federais de saúde e educação. Os recursos
bloqueados devem ser utilizados para normalizar pagamentos e garantir a
continuidade destes serviços.
Segundo o MPF, entre outubro e
dezembro, Macapá recebeu mais de 4 milhões de reais pelos programas do governo
federal Saúde da Família, Saúde Bucal e Núcleos de Apoio à Saúde da Família. Há
fortes indícios de desvio das verbas. “Não se pode deixar de tocar os projetos
que tenham verbas federais. E elas têm chegado”, diz Almir Sanches, procurador
da República responsável pelo caso.
O prefeito Roberto Góes pode ser
responsabilizado por improbidade administrativa e por crime federal. Além
disso, o órgão investiga se a inadimplência está relacionada à recente campanha
eleitoral de Góes, que foi preso na Operação Mãos Limpas da Polícia Federal, em
2010. À época, a PF investigava um suposto esquema de desvios de verbas
federais por políticos, funcionários públicos e empresários no Amapá. O
pedetista era suspeito de ocultar e adulterar provas das fraudes para obstruir
a investigação.
Além de demitir mais de 600
profissionais da educação, a prefeitura também interrompeu o pagamento das
empresas que fornecem merenda e o transporte escolar foi paralisado devido à
falta de pagamento. As verbas dos programas nacionais de Alimentação Escolar e
de Apoio ao Transporte Escolar têm, no entanto, sido recebidas regularmente. “A
situação é grave, pois a cidade já conta com serviços de saúde e educação bem
precários e ainda tem que enfrentar esse tipo de problema. Isso mostra que o
descaso com a coisa pública pode ser fruto de desvio ou, em uma hipótese menos
séria, uma ineficiência absurda da administração pública”, afirma Sanches.
Outra irregularidade identificada é a
retenção, por parte da prefeitura, do pagamento de empréstimos consignados de
seus funcionários. A administração desconta da folha de pagamento dos
servidores as parcelas, mas não repassa aos bancos. O MPF estima que até o
final de novembro, Góes tenha descontado e não repassado aos bancos cerca de 14
milhões de reais. “Isso pode abalar o sistema financeiro nacional, pois o
empréstimo consignado tem juros menores devido à garantia de que os bancos vão
receber as parcelas diretamente do salário dos credores. Caso isso pare de
ocorrer, os riscos aumentam, os juros sobem e pode atingir outros locais”, diz
o procurador.
Enfim, entra ano e sai ano, de norte a
sul, na Amazonia ou qualquer lugar do país a história se repete. Triste Brasil.
Pobre povo brasileiro.
Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.brAutor de Direito das Coisas, Leud.
Membro da Academia Itanhaense de Letras.
( fonte: Carta Capital )
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