Memórias 15.
Kátia, uma lembrança.
O casal falava muito da
sobrinha. Até que numa das férias escolares, coincidentemente Lourenço conheceu
Kátia que foi para Itanhaem passar o verão. Menina muito atraente. Mulata
linda, ainda meio criança, meio mulher, mas com feições suficientemente prontas
para revelar o quanto seria bela quando estivesse naturalmente formada.
Aproximavam-se na idade, na
altura e, igualmente, eram fãs de Henrique e Sofia. Os tios bajulavam muito a
menina e a tratavam com bastante carinho. A única sobrinha do casal. Residia em
Campinas com os pais, há 200 km. da então ainda isolada e sempre bucólica
Itanhaém.
Durante algumas semanas,
naquelas férias de verão, celebraram a amizade forte que surgiu do nada.
Amizade estreita que se projetou ao longo de outras férias escolares. Por anos
seguidos viveram a amizade nascida na casa do seu Henrique, que para ela falava dele e para ele, falava dela.
Durante aquelas férias
conviveram bastante: Saiam juntos de bicicleta, iam à praia, nadavam no rio.
Iam para todos os cantos, acompanhando seu
Henrique e a dona Sofia... Iam à
vila, ao convento, à praia do Tombo. Andavam por Itanhaém inteira.
Interessante descrever que o
rio Itanhaém é formado há uns 6 km do mar, pela junção do rio Preto, que vem do
pé da serra do Mar, nos confins de Itariri, mais ao sul, próximo da aldeia dos
Guaranis e pelo rio Branco, vindo do
norte, desde Agenor de Campos, na planície entre a serra e o mar.
Bem interessante destacar que
o rio Preto, tem a água escura, cheia de planctus
que dá a coloração especial e o colorido muito atraente. O outro tem a água
arenosa... daí os nomes: Rio Branco e rio Preto.
Lá, onde os rios se encontram
existe uma ilha fluvial. É um aglomerado de rurícolas, onde habitam pessoas
humildes, meio caiçaras, um tanto pescadores,
meio lavradores, outro tanto caipiras, mamelucos e mulatos, que àquela época,
eram os únicos moradores, que se diziam descendentes de negros fugidos e
indígenas agregados, revelando-se possuidores de características próprias e
indeléveis, desde a fala, passando pela
cor, e os costumes. Pois nessa ilha e em seu entorno, tanto às margens do rio
Preto, como do Rio Branco, então, isolados, salvo pela hidrovia natural, se
constituiu um bairro, que por falta de criatividade, passou a designar-se
Bairro, atribuindo-se à Itanhaém, a única cidade que, no mundo civilizado, tem
um bairro, chamado Bairro.
Lá no Bairro, no início dos
anos cinqüenta, foi filmado Arara Vermelha, produção nacional da Atlântida ou
da Vera Cruz... História que envolvia indígenas, sexo e natureza.
O velho polonês, por razões
que Lourenço não se recorda, ia ao
Bairro com bastante freqüência. Naquelas férias, quase na mesma
assiduidade, Kátia e Lourenço também o acompanhavam. E passavam o dia por lá.
Nadavam, subiam em arvore, adentravam em trilhas, comiam goiabas e pitangas...
Juntos com os filhos dos
moradores brincavam, faziam arapucas para pegar passarinho e divertiam-se como
poucos à época e ninguém, atualmente, sabe como. Até um cerco de varas ajudaram
a construir na parte leste da ilha...
Entre os moradores do Bairro,
um velho pescador, sempre sentado à porta de uma casinha de madeira tecia fios
de corda fazendo rede para pesca. Era o Vovô, como o chamavam e, tinha cento e
tantos anos de idade. Lourenço lembra-se bem do velho mulato, de cabeça com
cabelos ralos e brancos...
As férias com Kátia foram se
repetindo com certa freqüência por alguns anos. Os hábitos dos dois foram se
adaptando ao crescimento, a idade e a malicia, que, na infância, não se
apercebiam, mas de uma para outras férias, provocava mudanças e, naturais
aproximações e distanciamentos.
Lourenço se recorda com
saudades de Kátia e marca bem que a última vez que a viu, já era um homem, na
Igreja de São Gonçalo, na cidade S. Paulo, durante a missa de sétimo dia em
homenagem o falecimento da dona Sofia tia
da menina que já era mulher.
- Talvez 1970.
Recorda-se que Kátia já uma
mulher feita e bem postada, chamava bem atenção pelo corpo, pela beleza e
charme. Lembra-se bem que intimidados, mal se cumprimentaram.
Nunca mais se viram.
Roberto J. Pugliese
Membro da Academia Eldoradense de Letras
Membro da Academia Itanhaense de LetrasTitular da cadeira nº 35 – Academia de Letras de São José.
Nenhum comentário:
Postar um comentário