11 de Setembro, quarenta anos depois.
O Expresso Vida, lembra o assassinato de Allende,
promovido pelos Estados Unidos, que destruiu um sonho e uma geração.
“Aprendam a lição... (porque)
muito mais cedo do que tarde, se abrirão novamente as grandes alamedas por
onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor.. Tenho a
certeza que meu sacrifício não será em vão.
O golpe militar, a morte de
Salvador Allende e o fim do governo da Unidade Popular, na manhã nublada,
fria e melancólica de Santiago do Chile, daquele 11 de setembro de 1973, foi
um momento trágico da história política da esquerda latino-americana, e foi
também um momento de mudança irreversível do pensamento crítico e progressista
do continente.
Nos anos 60, e até o início da
década de 70, do século passado, América Latina viveu um momento de intensa
criatividade intelectual e política. Foi o período áureo da revolução cubana
e de sua influência sobre os movimentos de luta armada do continente, em
particular, no Brasil, Uruguai e Argentina, e um pouco mais tarde, na América
Central. Foi o tempo do reformismo militar de Velasco Alvarado, no Peru, e de
Juan Jose Torres, na Bolívia; da volta do peronismo e da e da vitória de Juan
Domingos Peron, na Argentina; da primeira experiência reformista
democrata-cristã, na Venezuela, e acima de tudo, do “reformismo cepalino”, de
Eduardo Frei, e do “socialismo democrático”, de Salvador Allende, no Chile.
Tendo como pano de fundo, como desafio político e intelectual, o “milagre
econômico” do regime militar brasileiro.
Neste período, Santiago
transformou-se no ponto de encontro de intelectuais de todo mundo, e virou o
epicentro do que talvez tenha sido o período mais criativo da história
políticas e intelectual latino-americana, do século XX. Revolucionários e
reformistas, democrata-cristãos, socialistas, comunistas e radicais,
tecnocratas e intelectuais, líderes sindicais, sacerdotes, artistas e
estudantes discutiam – a todas as horas e em todos os cantos da cidade –
sobre a revolução e o socialismo, mas também, sobre o desenvolvimento e
subdesenvolvimento, industrialização e reforma agrária, imperialismo e
dependência, democracia e reformas sociais, e sobre a própria especificidade
histórica do capitalismo latino-americano.
Por que Santiago? Porque o
Chile foi o único país do continente onde se tentou – de fato – combinar
democracia com socialismo, nacionalizações com capitalismo privado, e
desenvolvimentismo com reforma agrária, durante o período da Frente Popular,
entre 1938 e 1947, e durante o governo da Unidade Popular, entre 1970 e 1973,
mas também, de certa forma, durante o governo democrata-cristão, de Eduardo
Frei, entre 1964 e 1970. Na década de 1930, os socialistas e comunistas
chilenos formaram uma Frente Popular com o Partido Radical, venceram as
eleições presidenciais de 1938, e depois foram reeleitos mais três vezes,
antes de serem separados pela intervenção norte-americana, no início da
Guerra Fria, em 1947.
Os governos da Frente Popular
chilena, sob a liderança do Partido Radical, colocaram sua ênfase nos
programas de universalização da educação e da saúde publica, mas também na
infraestrutura, no planejamento e na proteção do mercado interno e da
indústria. Mas foi só em 1970, que o governo da Unidade Popular propôs
explicitamente um projeto de “transição democrática para o socialismo”, como
estratégia de desenvolvimento e sem destruição da economia capitalista.
Antes de Allende, os
democrata-cristão “chilenizaram” o cobre, e começaram a reforma agrária, mas
o governo da UP acelerou a reforma agrária e radicalizou a nacionalização das
empresas estrangeiras produtoras de cobre, e foi além disto, ao propor criar
um “núcleo industrial estratégico”, de propriedade estatal, que deveria ser o
líder da economia capitalista e o embrião da futura economia socialista. Este
foi, aliás, o pomo de discórdia que dividiu a esquerda durante todo o governo
da Unidade Popular, chegando até o ponto da ruptura, entre os que queriam
limitar as estatizações industriais aos setores estratégicos da economia, e
os que queriam estendê-las, até originar um novo “modo de produção”, sobre a
hegemonia estatal. Pois bem, este projeto absolutamente original de
“transição democrática para o socialismo”, do governo da Unidade Popular foi
interrompido pelo golpe militar do general Pinochet, com apoio decisivo dos
EUA e do governo militar brasileiro.
Mas como previu Salvador
Allende, no seu último discurso, “muito mais cedo do que tarde”, o Partido
Socialista voltou ao governo do Chile, em 1989, aliado com os
democrata-cristãos. Só que naquele momento, os comunistas chilenos haviam
sido dizimados, e os socialistas já haviam aderido ao consenso neoliberal,
hegemônico durante a década de 90, e haviam deixado de lado os seus sonhos
socialistas.
Uma década depois, entretanto,
no início do século XXI, a esquerda avançou muito mais e conquistou o governo
de quase todos os países da América do Sul. E nesta hora, um grande numero de
jovens das décadas de 60 e 70, que escutaram as últimas palavras de Allende,
no Palacio de la Moneda, foram chamados a governar.
Por todo lado, em vários pontos
da América do Sul, a esquerda voltou a discutir sobre o socialismo, o
desenvolvimentismo, a igualdade e as novas estratégias de transformação
social, para o século XXI.
Mas depois de uma década, a
esquerda latino-americana se deu conta que a palavra “socialismo’ hoje tem
conotações absolutamente diferentes nas Montanhas Andinas, nas Grandes
Metrópoles, nos pequenos povoados, ou nos vastos campos ocupados pelo sucesso
exportador do agrobusiness; que o “desenvolvimentismo” se transformou num
projeto anódino e tecnocrático, desprovido de qualquer horizonte utópico; que
defender a “indústria” ou a “re-industrialização”, virou um lugar comum da
imprensa, que pode significar qualquer coisa segundo o economista de turno; e
o “reformismo social” foi dissolvido num conjunto de políticas e programas
desconexos originários do Banco Mundial, mais preocupado com o seu
“custo-efetividade” do que com a luta pela igualdade social.
|
Por José
Luís Fiori/Carta Maior
O Expresso Vida nessa publicação deixa patente seu
respeito por todo o drama e o trágico fim do sonho democrático socialista dos
chilenos.
Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.brpresidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos –OAB-Sc
(Fonnte: Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares William Santos, Pres. da CDH da OABMG.)
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