A
origem do direito de propriedade imóvel no Brasil.-*
A
história do Brasil começa bem antes da chegada do europeu em solo americano. O
início da formação territorial do Brasil remonta com o notabilizado tratado de
Tordesilhas, celebrado em 07 de junho de 1494, por D. João, Rei de Portugal e,
D. Fernando e Isabel, reis de Espanha, Castela, Leão, Aragão, Granada e Estados
Ibéricos menores, que houve dividir as terras que eventualmente fossem
descobertas entre os dois monarcas e os Estados que representavam.
Pelo
acordo internacional, o mundo foi dividido por uma linha imaginária que o rodeava
do polo Ártico ao polo Antártico, há 370 léguas das ilhas de Cabo Verde na
direção ocidental, de forma que seriam portuguesas as terras e outros bens que
fossem descobertos à direita da aludida linha divisória e aos espanhóis, as
terras da esquerda...O tratado trouxe indignação e perplexidade, provocando nos
franceses certa ironia e muita cobiça.
Quando
Cabral aportou na Bahia em 1.500, após
quase sete anos da lavra do referido tratado de Tordesilhas, e tomou posse do
que houve denominar ilha de Vera Cruz, o fez em nome do Rei de Portugal cuja
personalidade incorporava igualmente o Estado português. Confundiam-se àquela
época, a pessoa do chefe de Estado com a pessoa jurídica de direito público que
é o próprio Estado. Assim, o Brasil, tratava-se de verdadeira fazenda do
Rei, ou como oficialmente lembrado, do Monarca que representava o Estado
soberano português.
D
Manuel, o soberano português e legítimo representante do referido Estado e
titular do direito de propriedade daquele formoso sítio, manteve durante seu
reinado a terra como reserva técnica para futura exploração, já que o grande
interesse econômico àquela época era a exploração do oriente, onde povos
laboriosos tinham produtos de elevada cobiça européia, servindo o território
americano, tão somente de ponto para abastecimento ou conserto das naves
rudimentares que atravessavam o Atlântico para alcançar o oceano Índico.
Insta
salientar que o direito do colonizador foi então imposto ao colonizado e
prevaleceu de modo natural, em razão do predomínio cultural de um sobre o outro
e, assim, a legislação da metrópole se impôs sobre o precário e inocente
direito indígena, surgindo em relação aos imóveis, o direito de propriedade
exclusiva, contrapondo-se a propriedade coletiva até então adotada pelos
ameríndios.
Com
o latente interesse em preservar o grande latifúndio que adquirira, a Coroa
portuguesa em 1530 patrocinou a vinda de Martin Afonso de Souza, para deixar
alguns degredados espalhados pelo litoral, impondo desse modo a marca por
diversos pontos e autenticando a posse política da terra, posto que o grande vazio
de brancos convidava incursões repetidas de piratas patrocinados por potencias
rivais que insistiam em ignorar o célebre tratado ibérico.
A
partir de então, surgem ao longo da costa brasileira os primeiros aglomerados,
feitorias, empórios, portos e vilas, iniciando de forma oficial a colonização
no continente invadido pelos portugueses, transformando a propriedade coletiva
indígena até então existente na bucólica Pindorama, no direito absoluto,
vigente na Europa medieval que propiciou e deu origem a propriedade privada no
Brasil.
Por
razões naturais o litoral e as ilhas marítimas e oceânicas foram primeiras a
serem colonizadas. Ao longo do tempo a costa brasileira foi tornando-se mais
habitada, a ponto de atualmente, a maior parte da população brasileira está,
ainda, ao longo dos 200 km. da faixa litorânea, permanecendo um grande vazio no
oeste e todo interior.
No
litoral paranaense, a história do Estado se confunde com as primeiras povoações
do seu pequeno litoral. Guaraqueçaba, Antonina e Paranaguá, foram entrepostos
que, transformados em vilas e posteriormente em cidades, deram origem a colonização paranaense.
A
origem da propriedade no Brasil se perde portanto nas folhas dos cadernos amarelados da história de
mais de 500 anos, trazendo junto, a firmeza do direito e vícios advindos pelos
modos elitistas que se impuseram ao longo do tempo, cujo resultado é
perceptível quando constatamos tantas e tantas lides e conflitos fundiários,
notadamente no litoral, cuja cobiça decorrente da valorização, tem provocada
prejuízos morais, econômicos e humanos.
Não
é novidade, mas ao longo do litoral, as brigas pela posse e propriedade de
áreas, muitas vezes, consistentes em manguezais, charcos, dunas, restingas e
demais acidentes tutelados legalmente, com
atos de violência e desprezo a plêiade legislativa ocorrem, quer pela
cobiça natural em razão de valores econômicos ou pela concentração exacerbada
de renda, poder e terras nas mãos de poucos em detrimento de multidões, mas
também pela fragilidade da ordem jurídica, nem sempre suficientemente razoável
para tutelar o direito fundiário de modo a impor respeito pela educação e
temor.
Enfim,
a origem do direito de propriedade imóvel, nas condições elitistas que foi
implementada pelo colonizador português,
estruturada para a vocação concentradora em detrimento da sua democratização, é a principal razão, que contemporaneamente,
envolve todo o país, especialmente as áreas mais apreciadas, no valorizado
litoral, em disputas intermináveis que culminam em atos sangrentos de
violência, banditismo e entupimento dos foros das Comarcas costeiras.
Roberto J. Pugliese
Advogado – Autor de
Terrenos de Marinha e seus Acrescidos. Letras Jurídicas,2009.
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