05 janeiro 2012

Cataia - whisky dos caiçaras !

Planta encontrada na Barra do Ararapira, no Parque Nacional de Superagui, deixa a cachaça com um gosto especial e conquista apreciadores.

FRANCO CALDAS FUCHS, ESPECIAL PARA A GAZETA DO POVO

Um arbusto encontrado no Parque Nacional do Superagui, em Guaraqueçaba, é a base de uma bebida conhecida como o uísque caiçara. A cataia, cujo nome em tupi-guarani significa “folha que queima”, é o ingrediente capaz de transformar a pinga em um líquido da cor do uísque, tão precioso quanto um bom scotch. Mesmo sem ser vendida em larga escala, pela dificuldade de obtenção – a planta é encontrada em uma faixa de terreno alagado e de difícil acesso na Barra do Ararapira, a 40 quilômetros de Superagui –, a bebida ganha novos admiradores a cada dia. Quem vai a Guaraqueçaba ou à Vila de Superagui e prova a bebida não se esquece mais. Foi assim com o médico veterinário Reinaldo Zaleski, 28 anos, de Curitiba. “Conheci a cataia em 2001, na primeira vez que visitei Superagui. Experimentei ao som de um bom fandango”, recorda.

Rubens Muniz diz ser o primeiro a pôr cataia e cachaça na mesma garrafa Arbusto também é usado como remédio São muitas as propriedades curativas atribuídas à cataia, planta conhecida cientificamente como Pimenta pseudocaryophyllus. A planta é utilizada tanto para cicatrizar ferimentos, como para tratar problemas estomacais, como azia, diarreia e dor de estômago. Há também quem diga que ela é um santo remédio para combater a impotência sexual. Sem falar do uso culinário. “Tem muita gente que gosta de temperar alimentos, doces ou salgados, com a cataia. Ela pode entrar no feijão, por exemplo, substituindo a folha de louro”, conta Shirlei Pinto, integrante da Associação das Mulheres da Barra do Ararapira.

No intuito de investigar as características da planta, o professor de Bioquímica da Universidade Federal do Paraná no Litoral (UFPR-Litoral) Rodrigo Vassoler Serrato iniciou um projeto de pesquisa sobre a cataia no fim do ano passado. “A intenção é avaliar as propriedades medicinais da planta. O que já se sabe é que ela é rica em um composto como o eugenol, substância antiséptica e anestésica muito utilizada na fabricação de pastas de dente”, afirma Serrato. Desde então, Zaleski sempre tem uma garrafa em casa, preparada por ele mesmo com as folhas que traz a cada visita ao Superagui. “O sabor e o frescor são únicos. Por isso é bom bebê-la pura, sem gelo. Só que é preciso saber tomar, senão você cai. O segredo é tomar de bicadinha”, aconselha. A bebida tem teor alcoólico variando entre 20% e 40%, dependendo do preparo. Outro apreciador da cataia é o engenheiro agrônomo Carlos Campos, que trabalha em Gua¬raqueçaba há 5 anos. Desde que aprendeu a receita na Barra do Ararapira, Campos passou a fazer experimentações, curtindo a cataia na tradicional cachaça de Morretes, na vodca, no steinhager, no conhaque e até no uísque. “A planta fica bem com quase todos os destilados. Sem falar que, misturada ao mel de jataí ou com limão, também fica excelente”, conta o agrônomo, que mantém uma produção artesanal em casa. “Tive de aumentar a produção para atender aos amigos. Eles sempre fazem a limpa no meu estoque”, revela.

Origem Pela proximidade com a Ilha do Cardoso (SP), onde também há cataia, a origem da bebida é reivindicada igualmente pelo Litoral paulista. A discussão termina, porém, quando chega aos ouvidos de Rubens Muniz, 63 anos. Nascido e criado na Barra do Ararapira, onde tem uma pousada e restaurante, Muniz é categórico em afirmar que foi ele quem teve a ideia de misturar cataia e cachaça na mesma garrafa. “Nossos antepassados já usavam o chá da planta para tratar azia, má digestão e muitas outras coisas. Até que, em 1985, resolvi experimentá-la na pinga. E deu certo”, relata.

Hoje há um bom número de pessoas preparando a cataia por conta própria e é possível encontrar algumas garrafas com rótulos das cidades paulistas de Cananeia e Ilha Comprida. Mas quem quiser experimentar a legítima cataia engarrafada em Superagui pode procurar por Edna Aparecida Santana, nora do seu Muniz. Ela preside a Associação de Mulheres da Barra do Ararapira, grupo que passou a comercializar o uísque caiçara como forma de complementar a renda familiar – atividade apoiada pela prefeitura de Guaraqueçaba e pelo Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Paraná (Emater-PR). “Colhemos a planta no meio do mato, o que fazemos com muito cuidado. Diferente de muita gente que vem aqui, arranca quase a árvore inteira e vai embora”, desabafa Edna, denunciando a extração predatória.

Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, a extração de cataia no Parque Nacional do Superagui fica restrita à comunidade do Ararapira e em caráter excepcional. “Em uma unidade de proteção integral como Superagui é claro que o uso dos recursos naturais é vedado. Mas entendemos que o uso da cataia por essa comunidade tradicional não traz prejuízo ao ambiente e assegura um retorno econômico a eles”, diz Marcelo Bresolin, chefe do Parque Nacional do Superagui.

Serviço A bebida engarrafada pelas Produtoras de Cataia da Barra do Ararapira é vendida a R$ 15 o litro em diversos estabelecimentos de Guaraqueçaba e diretamente na Barra do Ararapira. Informações na Pousada Izamar, telefone (41) 3852-1181. Na Vila do Superagui também há diversos estabelecimentos que vendem cataia, como o Bar e Pousada Akdov, telefone (41) 3482-7158.


Para quem gosta de cachaça, a mistura é realmente uma delicia...

Roberto J. Pugliese

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