22 dezembro 2013

Motor fundido na Rodovia dos Bandeirantes. ( memória nº 49 )


Memória nº 49
Gurupi, São Paulo: fundiu o motor.

 

A vida é cheia de experiências. Boas que não queremos esquecer e outras que evitamos lembrar. Quem sabe viver sempre tem algo que já passou e pode relatar. Dezembro de 1989, época de chuva, com estradas alagadas e muito calor.

 

O Brasil depois de tantos anos havia eleito pelo voto direto o seu presidente. Mudanças inúmeras estavam previstas para o povo.

 

No Tocantins Lourenço deixaria o carro que comprara para sua mulher em São Paulo, pois retornaria em Janeiro com a mudança e o seu próprio automóvel. Voltaria para Itanhaém de avião. No entanto, Nadim, o advogado conselheiro da OAB local, que o recebera bem, teria que levar um carro para São Paulo, por alguma razão e ciente da situação sugeriu que Lourenço o conduzisse.

 

As datas foram marcadas e remarcadas. O Natal se aproximando e nada de Lourenço voltar à Itanhaém. Gorgone, seu velho amigo de Cananeia e delegado de policia no Peixe, cidade distante 70 km. de Gurupi, pediu que levasse a japonesinha que trouxera de lá e estava criando. Uma carona para menina ir passar o natal com a família. Deixaria na casa de um parente em S. Paulo.

 

Com onze anos de idade, a menina bem criança, comportada, tímida, talvez até amedrontada, iria com Lourenço e com o rapaz, cunhado do Nadim.

 

Depois de idas e vindas, dia marcado, partiram de Gurupi, num final de tarde, os três. O jovem, a menina e  Lourenço, que ficou responsável pelo automóvel e pela japonesinha... inclusive, de certo modo, pelo rapaz que nem tinha 20 anos de idade.

 

Muita chuva, estradas alagadas, barreiras desmoronadas, congestionamentos e confusão desde o Tocantins até... sabe-se lá. Por volta das 20 horas chegaram em Ceres, no Estado de  Goiás, uma cidade equipada para passarem a noite, jantarem e seguirem viagem no dia seguinte.

 

Hospedaram-se no melhor hotel: Uma antigo convento, com corredores e paredes enormes. Portas pesadas e mobiliário rústico. Dois apartamentos: Um para ela e outro, ao lado, para eles.

 

Jantaram num quiosque no meio de uma praça típica do centro oeste, em cima de um coreto, próximo a fonte luminosa, que por aquelas bandas é comum e torna-se referencia de progresso local. (?)

Tudo em ordem, porém com a preocupação pela responsabilidade, pois o rapaz já havia demonstrado certo interesse pela criança. E não fizera segredo, dizendo que iria para o quarto dela...

 

Lourenço determinou que a menina se trancasse no seu apartamento e não abrisse para ninguém. Fez o mesmo no seu e recolheu a chave, para evitar que durante a madrugada pudesse surpreender-se com a saída do jovem parceiro de viagem.

 

Tudo bem. Sem maiores problemas no dia seguinte seguiram viagem. Com as estradas bloqueadas pelas enchentes diversas, foram obrigados a mudar a rota e seguiram por Rio Verde...

 

Cada 200 ou 300 quilômetros, desde o início, por recomendação do proprietário do automóvel, além de abastecer, completava o óleo do carter pois o motor queimava e baixava radicalmente o nível.

 

Por volta das 15 horas pararam em Americana ou Limeira, já em São Paulo. A última parada prevista. Lourenço foi com a menina comprar alguma coisa para tapear o estomago dos três e deixou o rapaz cuidando do abastecimento e demais necessidades exigidas pelo auto: Água, óleo, limpeza dos faróis, para-brisa para seguirem viagem.

 

Daí para frente o volante foi entregue ao rapaz, já que desde a véspera Lourenço dirigia e, pela segurança da rodovia dos Bandeirantes entendeu permitir a mudança.

 

Estavam quase chegando à cidade. Já era Purus, próximo ao pedágio que há às vistas da Serra dos Cristais e ... o carro fez um estrondo, saiu fumaça e parou junto a ilha central que divide as pistas...  Estancou. No meio do transito intermitente de veículos que trafegam em alta velocidade pela faixa de esquerda.

 

Lourenço ordenou que todos saíssem do auto, trancasse o veículo e olhando o lugar, depois de fixar o triangulo de segurança há uns vinte  ou trinta metros do local, segurando firme a mãozinha da japinha, atravessaram a pista, com 3 faixas de rolamento, e seguiram à pé mais uns 50 metros até o Frango Assado, um posto de serviço, com restaurante e diversidade de ofertas existente, talvez por sorte, junto à rodovia.

 

.......

 

Não teve jeito. Conseguiram guinchar o carro até o restaurante e num taxi que aparecera, prosseguiram viagem à São Paulo.

 

Primeiro deixou a menina na casa da tia, que por sinal, também conhecia de Cananéia... E livrou-se de um primeiro problema. Uma responsabilidade a menos.

 

Em seguida rumou para a casa de seus pais que o esperava para ir ainda àquela noite para Itanhaém. Lá, pagou a corrida, e deixou o rapaz seguir viagem até o seu destino no mesmo taxi.

 

Ligou para o proprietário: - Seu carro está com o motor fundido, no Frango Assado do km. 14 da via Bandeirantes...

 

O jovem cunhado deve ter feito o mesmo ao chegar ao seu destino...

 

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Essa foi a entrada triunfal que teve no Tocantins, notadamente em relação ao colega advogado, que, jamais o perdoou, por ter vacilado em completar o óleo, porque se distraíra e o cunhado não observou com atenção, causando um grande prejuízo econômico ao prestativo colega.

 

Durante os anos que passou no Tocantins, Nadim sempre, ainda que disfarçasse, foi seu adversário. Sem perdão. Não vacilou em trabalhar politicamente contra Lourenço, quer na OAB onde era Conselheiro, quer na política partidária, em lado oposto.

 

Enfim, nestas lembranças merece registrar que Nadim fora quem arrumara ao Gorgone o cargo de delegado do Peixe, o qual nele permaneceu até ser nomeado por concurso tabelião de Jaú do Tocantins, cidade mais a oeste.

 

 

Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.br
presidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos –OAB-Sc

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