21 dezembro 2013

O notário e o bom direito. ( memória nº47)


Memória nº47

Escritura pública de casamento e divórcio.

 

Durante os oito primeiro anos da década de 1970 Lourenço trabalhou no cartório de notas e, com muito interesse se dedicou e tentou aprender ao máximo seu oficio. Gostava bastante do que fazia.

 

Foi escrevente muito dedicado e com clientela de estirpe que angariou junto aos colegas de faculdade, com os loteadores da Ilha Comprida e com os clientes que foram de seu pai que se aposentara. Trabalhava muito e com bastante conhecimento. Ganhava muito dinheiro àquela época.

 

Certa tarde um advogado seu amigo e cliente esclareceu que precisava que fosse à Sinagoga no sábado para lavrar um casamento. Tratava-se de um casamento que seria celebrado entre uma jovem judia rica e um judeu espertalhão que não tinha a benção e confiança dos pais da moça. No entanto, a família queria justificar para a sociedade que a moça iria casada residir no Canadá, mas não queria que casasse verdadeiramente.

 

Enfim, o advogado falou que precisava de um ato que levasse a crer que houvessem casados para os convivas que estivessem presentes à cerimônia religiosa.

 

Para quem não sabe o cartório de notas não tem competência para lavrar casamentos, que compete ao cartório de paz, ou registro civil das pessoas naturais.

 

Lourenço matutou o suficiente e lavrou um pacto ante nupcial, estabelecendo o regime de casamento das partes e que, para o público, dava impressão da celebração das núpcias civis.

 

O advogado alertara que provavelmente em um ou dois anos estariam se divorciando. Que bastava aguardar, pois o espertalhão não era confiável e a família previa o rompimento do casamento, razão até que não queria que houvesse o verdadeiro casório, pois àquela época, não havia em vigor no país o instituto jurídico do divórcio. O casamento era indissolúvel.

 

Passados mais de um ano e menos de dois, novamente o advogado, solicitou a presença de Lourenço, na mesma Sinagoga, num determinado sábado para lavrar o divórcio, que repete-se: não era legalmente admitido no país.

 

Como não houvera casamento, Lourenço apenas lavrou uma escritura de declaração, que foi lida perante o Rabino, através da qual, as partes, marido e mulher, declaravam que haviam celebrado um ato civil, no mesmo cartório de notas, no livro nº x e que o casamento não se concretizara, motivando pois, anularem aquela escritura para que não produzisse nenhum efeito, pois não iriam concretizar o matrimonio prometido...

 

E Lourenço deu solução à questão que lhe foi apresentada agradando a todos, inclusive a ele, que satisfazendo aos interessados, ganhara gorda gratificação.

 

Lourenço aprendeu com o seu pai, velho e dedicado notário, que a função do tabelião é concretizar, na forma da lei, a vontade das partes, desde que não prejudique ninguém. Que não deve ter receio e agir sempre procurando fazer com que os interessados atinjam o melhor caminho do bom direito, de modo rápido e econômico em todos os sentidos. Essa e tantas outras lições nunca mais esqueceu.

 

Roberto J. Pugliese
presidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos –OAB-Sc

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