Memória nº47
Escritura pública de casamento
e divórcio.
Durante os oito primeiro anos
da década de 1970 Lourenço trabalhou no cartório de notas e, com muito
interesse se dedicou e tentou aprender ao máximo seu oficio. Gostava bastante
do que fazia.
Foi escrevente muito dedicado
e com clientela de estirpe que angariou junto aos colegas de faculdade, com os
loteadores da Ilha Comprida e com os clientes que foram de seu pai que se
aposentara. Trabalhava muito e com bastante conhecimento. Ganhava muito
dinheiro àquela época.
Certa tarde um advogado seu
amigo e cliente esclareceu que precisava que fosse à Sinagoga no sábado para
lavrar um casamento. Tratava-se de um casamento que seria celebrado entre uma
jovem judia rica e um judeu espertalhão que não tinha a benção e confiança dos
pais da moça. No entanto, a família queria justificar para a sociedade que a
moça iria casada residir no Canadá, mas não queria que casasse verdadeiramente.
Enfim, o advogado falou que
precisava de um ato que levasse a crer que houvessem casados para os convivas
que estivessem presentes à cerimônia religiosa.
Para quem não sabe o cartório
de notas não tem competência para lavrar casamentos, que compete ao cartório de
paz, ou registro civil das pessoas naturais.
Lourenço matutou o suficiente
e lavrou um pacto ante nupcial, estabelecendo o regime de casamento das partes
e que, para o público, dava impressão da celebração das núpcias civis.
O advogado alertara que
provavelmente em um ou dois anos estariam se divorciando. Que bastava aguardar,
pois o espertalhão não era confiável e a família previa o rompimento do
casamento, razão até que não queria que houvesse o verdadeiro casório, pois
àquela época, não havia em vigor no país o instituto jurídico do divórcio. O
casamento era indissolúvel.
Passados mais de um ano e
menos de dois, novamente o advogado, solicitou a presença de Lourenço, na mesma
Sinagoga, num determinado sábado para lavrar o divórcio, que repete-se: não era
legalmente admitido no país.
Como não houvera casamento,
Lourenço apenas lavrou uma escritura de declaração, que foi lida perante o
Rabino, através da qual, as partes, marido e mulher, declaravam que haviam
celebrado um ato civil, no mesmo cartório de notas, no livro nº x e que o
casamento não se concretizara, motivando pois, anularem aquela escritura para
que não produzisse nenhum efeito, pois não iriam concretizar o matrimonio
prometido...
E Lourenço deu solução à
questão que lhe foi apresentada agradando a todos, inclusive a ele, que
satisfazendo aos interessados, ganhara gorda gratificação.
Lourenço aprendeu com o seu
pai, velho e dedicado notário, que a função do tabelião é concretizar, na forma
da lei, a vontade das partes, desde que não prejudique ninguém. Que não deve
ter receio e agir sempre procurando fazer com que os interessados atinjam o
melhor caminho do bom direito, de modo rápido e econômico em todos os sentidos.
Essa e tantas outras lições nunca mais esqueceu.
Roberto J. Pugliese
presidente da Comissão de Direito
Notarial e Registros Públicos –OAB-Sc
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