O torturador na vitrine
O torturador debruçava-se sobre a vítima com objetivos imediatos. Através da
destruição física e psicológica, buscava quebrar a vontade do torturado para
que denunciasse companheiros; revelasse locais de encontro e reunião; indicasse
atos passados e futuros.
Exigia que tudo revelasse, a fim de interromper a dor lancinante e o
medo à dilaceração irremediável da existência, vivida em extrema solidão.
A tortura durava minutos ou se mantinha por horas, dias e semanas; podia
deixar feridas, mais ou menos indeléveis, ou desembocar intencionalmente ou não
na morte, sobretudo diante de vontade inquebrantável. Após sevícias
inomináveis, Mário Alves morreu de hemorragia interna, empalado em cassetete,
por esbirros indignados com o mutismo férreo do baiano.
A tortura possuía objetivo mais ambicioso. Almejava impor o medo aos que
resistiam, pensavam em resistir, eram chamados à resistência, simpatizavam com
ela ou conheciam sua existência. Todos deviam vigiar atos e passos, para não
terminarem diante do torturador. Pais foram torturados diante dos filhos
pequenos; jovens foram estupradas por cães; militantes foram dilacerados até a
morte, como registro do direito absoluto do torturador.
Devido a essa função pedagógica, enquanto a ditadura negava a prática da
tortura, permitia-se que seu conhecimento penetrasse e aterrorizasse amplos
segmentos da população.
No Brasil, a tortura como arma policial e como instrumento de domínio social
foi instituição de Estado. Ela foi introduzida, sustentada, justificada,
financiada, apoiada ativamente pelas classes sociais que incentivaram e se
locupletaram com o golpe militar: industriais, banqueiros, latifundiários, a
grande imprensa, políticos conservadores, oficiais da ativa e retirados, a alta
hierarquia da Igreja e da Justiça etc.
Ainda hoje, as instituições judiciárias, legislativas e executivas do
Estado desdobram-se para proteger e encobrir os responsáveis e os executores
das práticas generalizadas de tortura e execução de prisioneiros políticos,
atos que a justiça internacional e o direito dos povos definem como
imprescritíveis e necessariamente objetos de punição exemplar.
Em 2010, o Superior Tribunal Federal reafirmou a impunidade daquelas
ações criminosas.
Em 14 de dezembro de 2011, a maioria dos vereadores porto-alegrenses,
inclusive de partidos punidos pela ditadura – PDT, PTB, PPS, PT –, negou, pelo
voto, abstenção ou ausência, a rebatizar de Leonel Brizola a atual avenida
Castelo Branco – que homenageia o primeiro ditador do regime militar.
Os torturados arrastaram para sempre as feridas recebidas nas carnes e na alma.
Amiúde, elas nunca cicatrizaram, sorvendo gota por gota a alegria da vida.
Também no Brasil, a taxa de suicídio entre os grandes torturados é
estarrecedora, e segue crescendo mesmo décadas após o martírio. Porém, em geral
em silêncio, essas vítimas da desumanização promovida pelo Estado carregam
orgulhosas a memória de luta empreendida, nas piores condições, por direitos
sociais e humanos inarredáveis.
Os torturadores, não. Promovidos em suas carreiras civis e militares e
retirados com aposentadorias magníficas, procuram esconder seus atos passados
ou diminuir a magnitude e o sentido dos mesmos, quando é impossível negá-los.
Sobretudo, mimetizam-se na população comum ou simplesmente recolhem-se para a
vida familiar e privada, escondendo-se por de trás das portas aferrolhadas de
seus ricos apartamentos e mansões.
Retomando a prática consagrada em países como o Chile e a Argentina, uma
garotada corajosa vem se postando diante das residências e locais de trabalho
de torturadores em Porto Alegre, Belo Horizonte, Fortaleza, São Paulo. Com
carros de som, cartazes, panfletos e muita gritaria, denunciam aos passantes e
vizinhos espantados, com farta documentação probatória, que ali se homizia no
anonimato gente responsável pelo crime inominável de tortura de prisioneiros e
prisioneiras inermes.
Em registro do indiscutível reconhecimento da infâmia de seus atos
impunes, os torturadores revelados apenas se esgueiram pelas portas traseiras
dos imóveis e residências ou arriscam-se a entrever os denunciantes, escondido
por entre as cortinas das janelas, como os ratos que mergulham espavoridos no
esgoto, aterrorizados pela luz do dia.
( escrito por Mário Maestri é historiador e professor do curso e do programa
de pós-graduação em História da UPF. Foi preso e exilado, quando estudante,
durante a ditadura militar. E-mail: maestri(0)via-rs.net –
Remetido por Vitor Hugo da Silveira Noroef )
Conselho Editorial (inspirado) Carlos H. Conny, presidente; M. Covas, Miguel S. Dias, W. Furlan, Edegar Tavares, Carlos Lira, Plínio Marcos, Lamarca, Pe. João XXX, Sérgio Sérvulo da Cunha, H. Libereck, Carlos Barbosa, W. Zaclis, Plínio de A. Sampaio, Mário de Andrade, H. Vailat, G. Russomanno, Tabelião Gorgone, Pedro de Toledo, Pe. Paulo Rezende, Tabelião Molina, Rita Lee, Izaurinha Garcia, Elza Soares, Beth Carvalho, Tarcila do Amaral, Magali Guariba, Maria do Fetal,
05 abril 2012
Torturadores expostos !!!
Advogado, paulistano, professor de direito, defensor de direitos humanos. Bacharel pela PUC -SP em 1974, pós graduado em Direito Notarial, Registros Públicos e Educação Ambiental. Defensor de quilombolas, caiçaras, indígenas, pescadores artesanais... Edita o Expresso Vida.
Autor de diversos livros jurídicos.São incontáveis os artigos jurídicos publicados em revistas especializadas, jornais etc. Integra a Academia Eldoradense de Letras,Academia Itanhaense de Letras. Titular da cadeira nº 35 da Academia São José de Letras. Integra o Instituto dos Advogados de Santa Catarina. É presidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos da OAB-Sc. Consultor nacional da Comissão de Direito Notarial e Registraria do Conselho Federal da OAB.Foi presidente por dois mandatos da OAB-TO - Gurupi. Sócio desde 1983 do Lions Clube Internacional. Diretor de Opinião da Associação Comercial de Florianópolis. Sócio de Pugliese e Gomes Advocacia. CIDADÃO HONORÁRIO DA ESTANCIA DE CANANÉIA, SP.
www.pugliesegomes.com.br
Residente em Florianópolis.
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