20 fevereiro 2012

Malvinas, crise politica 30 anos depois.

Argentina x Reino Unido x Malvinas x Falkland = CRISE POLITICA

Naqueles dias, já na agonia do regime militar, a ditadura enfrentava
problemas demais. O modelo econômico estava esgotado, havia um reboliço social,
a inflação alcançava patamares altíssimos, a miséria assomava. A saída
encontrada pela junta militar foi o apelo ao patriotismo.

E desde aí, o chamado
para a guerra contra a Grã-Bretanha no sentido de recuperar as ilhas que haviam
sido invadidas em 1833 durante o período em que os ingleses fizeram da América
Latina o seu espaço de poder colonial. A primeira ocupação do arquipélago
aconteceu em 1690, pela Espanha, então invasora oficial, e desde aí França e
Inglaterra lutavam pelo comando até que em 1833, quando a América Latina
terminava seu processo de libertação colonial, a Inglaterra consolidou seu poder
sobre as ilhas. Os argentinos, depois de finalizado o processo de libertação,
sempre reivindicaram aquele espaço como seu.

Assim, o motivo da disputa era mais
do que justo, embora o momento e a forma só servissem para desviar a atenção dos
problemas internos. O resultado só poderia ser o desastre.
Nesse sentido, a jogada dos militares foi, na verdade, o começo do fim do
regime. A guerra durou dois meses apenas, com a Argentina sendo solapada pelo
exército britânico. Morreram 649 soldados argentinos, 255 britânicos e três
civis das ilhas. E, ao final do conflito, com o governo militar sendo deixado
sozinho pelas demais nações, quem acabou pagando caro, como sempre, foi o povo,
tanto o argentino que sofreu o terror da guerra em sua porta (com a vinda de
bombardeiros nucleares para a costa), quanto o inglês.


A Inglaterra vivia
naqueles dias um processo eleitoral e a guerra foi a hora perfeita para
aprofundar as medidas de arrocho que já vinham sendo praticadas pela dama de
ferro, Margareth Tatcher.

Hoje, perto do aniversário de 30 anos do conflito, a militarização na área
das Malvinas faz acender o pisca alerta. Aquela não é uma região qualquer.
Geopoliticamente é a entrada para a região Antártica e estratégica no que diz
respeito ao tráfego marítimo no espaço austral. Além disso, fala-se em
prospecção de petróleo por parte da Inglaterra. Do ponto de vista da lógica, não
há argumento para que o arquipélago continue na mão dos ingleses, uma vez que
historicamente, na América Latina, o colonialismo já teria acabado.

Assim, nada
mais justo que aquele território voltasse para as mãos do povo argentino. Esse é
um debate que mexe com as entranhas de qualquer cidadão do país vizinho.

Assim, os últimos acontecimentos soam como uma provocação ao governo
argentino, que vive uma conjuntura bem diferente da época da guerra. Já não há
mais uma ditadura militar e sim um governo que não é bem visto pelo grupo dos
poderosos. Cristina Kirchner faria parte do chamado eixo-do-mal (governos de
esquerda) que governa hoje o continente latino-americano.

Para os argentinos, esse seria um bom debate, pois há uma grande parte da
população que não colocaria na presidente essa etiqueta de esquerda. Basta ver
os constantes conflitos e a feroz repressão que os trabalhadores vêm enfrentando
nas grandes cidades, no campo, na luta contra as mineradoras, na questão
indígena, sem que Cristina assuma uma posição favorável à maioria.

De qualquer sorte, a presidente pegou a pauta apresentada pelos ingleses e
tem feito duras declarações e denúncias sobre a militarização das Malvinas,
exigindo, inclusive, uma posição da ONU com relação a isso. A crise reacendeu
também um pouco do patriotismo que andava apagado e os veteranos da guerra
voltaram à cena, fazendo manifestações e se colocando do lado da presidente.

Mas, nesse universo de gente que lutou contra a Inglaterra naquela guerra
quase absurda, pois visava muito mais o fortalecimento da ditadura, gente há que
até hoje não foi reconhecida pela lei como veterana de guerra. São os soldados
que estiveram em alerta e a postos no continente. Segundo a lei que definiu
indenizações e pensões aos veteranos de guerra, apenas aqueles que participaram
do campo de batalha nas ilhas e no mar tiveram direito de ser reconhecidos. Os
soldados que ficaram no continente não foram considerados veteranos, coisa que
se colocou inaceitável por toda uma juventude que viveu o terror por dois meses,
sempre em alerta contra uma possível invasão pelos ingleses: "nós vivemos todo o
estresse de uma guerra real.

Nós esperávamos a cada minuto que um avião
bombardeasse nossas cidades, nós estávamos em prontidão, sofrendo e vivendo
todas as angústias das batalhas. Não é justo que nos abandonem agora”, afirma
Luis Gianini, do Acampamento Toas da Plaza de Mayo, que representa mais de 400
ex-soldados.

Esse acampamento foi erguido há quatro anos exigindo o reconhecimento destes
soldados, reivindicando que sejam incluídos no orçamento das aposentadorias.
Todos os dias, a presidente Cristina os vê de sua janela, faça chuva ou faça
sol. Mas, passado todo esse tempo nada foi conseguido, como se a governante
fosse incapaz de ver e ouvir o clamor das famílias que se revezam no
acampamento. O governo segue dizendo que os soldados que ficaram no continente
não participaram da guerra e por isso não teriam direito. Para os manifestantes,
essa posição é absurda e ninguém está disposto a desistir dessa luta.

Agora, na última semana, com a retomada do tema pela grande imprensa eles
decidiram fazer uma manifestação na 9 de julho (principal rua de Buenos Aires),
para que seus argumentos pudessem ser ouvidos, mas foram duramente reprimidos
pela polícia com caminhões lança-água e bombas de gás. Vinte e quatro pessoas
foram presas. Para os manifestantes, essa é só mais uma brutalidade do governo
que já os pune por não reconhecê-los. Mas, isso não os fará calar nem desistir
da luta. Nos últimos anos, os veteranos das Malvinas conquistaram aposentadorias
bastante polpudas (cerca de 1.500 dólares) e esses 400 soldados que viveram
todos os terrores da guerra, ainda que não tenham entrado em batalha, querem
fazer valer seus direitos.

"Para nós, muito mais do que o dinheiro é o
reconhecimento. Nós estivemos na guerra, nós sofremos tudo aquilo e a nação
argentina não pode nos excluir dessa triste página da história”.

( Elaine Tavares é jornalista do Instituto de Estudos Latino-americanos )
( Colaboração do sítio eletronico Desacato )

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